Conheço o disco de estréia do cantor e compositor israelense Yoav desde que foi lançado, mas como acontece com alguns discos e alguns artistas, Charmed & Strange foi relegado à um repouso por tempo indeterminado em minha biblioteca de música. Quando isso acontece, revisito descompromissidamente o álbum de quando em quando até que ele atinja um nível aceitável de simpatia. Claro que às vezes isso simplesmente não ocorre, e o destino do disco é o irremediável descarte, mas se insisto por um longo tempo, neste caso praticamente dois anos, é porque sei que a hora certa vai chegar.
A música criada pelo rapaz moreno com rosto de traços rudes e expressivos e voz juvenil é predominantemente acústica, em grande parte armada tão somente sobre guitarra e violão. Normalmente, a limitação de um músico à estes instrumentos invariavelmente enquadra sua produção dentro dos domínios do folk, mas nas mãos desse cantor dotado de uma destreza e flexibilidade impressionantes no manejo deles e, principalmente, dono de uma grande criatividade, ela não se contenta em permanecer dentro das fronteiras deste gênero: usando e abusando das alterações obtidas por pedais, Yoav engendra loops e beats tanto no dedilhar das cordas quanto tirando proveito do corpo dos instrumentos, fazendo as vezes de bateria e percussão batendo com as mãos – o resultado é uma música que emana um fulgor que na vertente acústica dificilmente seria obtido por apenas uma pessoa em um estúdio ou palco, já que em suas apresentações ao vivo o rapaz repete, em real-time, grande parte dos procedimentos. A faixa de abertura, “Adore Adore”, deixa nítido o que ele é capaz de fazer com sua técnica, já que tanto a batida que cresce ligeira quanto os toques precisos que o cantor arranca de sua guitarra, tão cortantemente amargurados quanto o seu vocal melancólico, impressionam sem muito esforço. E se a primeira música não for suficiente pra mostrar a versatilidade do cantor com sua guitarra e pedais, da segunda, “Club Thing”, isso não passa despercebido: introduzida por um beat marcadíssimo e sutilmente dançante e entoada em um registro vocal que alterna entre a voz macia e um falseto delicado, Yoav vai encorpando a melodia com a alquimia dos seus riffs, live loops e toques em sua guitarra e violão até fazer surgir uma mistura de pop e rhythm’n blues que ferve com uma soturna sensualidade. Isso, não significa, porém, que o compositor omita de suas criações a utilização de instrumental de apoio, como pode ser visto na discreta sintetização ao fundo em “Sometimes…”, que tem como destaque o beat curto e veloz que o cantor arranca do violão enquanto seus toques em segundo plano nas cordas fazem a melodia brilhar com luminosidade e calor, e em “Wake Up”, cuja batida e acordes tão característicos do estilo acústico do cantor arrastam-se em marcha até serem encorpados e continuamente acompanhados por uma sintetização de cordas que potencializa a enorme beleza da melodia. Mas mesmo resumindo-se ao seu pequeno arsenal, o cantor consegue mergulhar em ritmos e influências: “There Is Nobody”, por exemplo, tem a sutilíssima fragância do pop europeu dos anos 90 tanto na sua metade inicial, feita de acordes secos e ásperos sobre o ecoar de um pulso bem marcado, quanto no sua última parte, um intenso cavalgar mais melódico de riffs e uma batida mais consistente que nas mãos de um bom produtor de música eletrônica certamente seria convertida e uma faixa inusitadamente dançante, como aquelas feitas à época. Contudo, provavelmente é a angústia e melancolia palpáveis de “Beautiful Lie” que a põe como a melhor faixa deste primeiro disco do cantor isrealense: introduzida pelos acordes espaçados da guitarra que reverberam enquanto o cantor lança sua bela voz, a canção tem mais da metade de sua duração constituída de um vibrante solo harmônico de guitarra, feito de toques breves, ligeiros e virtuosos, que expande-se em uma harmonia de exuberante emoção. E pra quem está pensando que o rapaz só gosta de exibir-se virtuoso, o tradicionalismo das notas suaves, simples e discretas da triste balada “Angel and the Animal” comprovam que ele sabe compor dentro do estilo pop/rock mais clássico, o que também, espertamente, serve como “respiro” para não cansar o público em meio à quase um álbum inteiro de experimentações percussivas e acústicas – ufa!
senha: seteventos
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