Dois policiais de Miami disfarçam-se como transportadores de drogas para entrar em um cartel internacional, com o objetivo de melhor atingir seus compradores em Miami. Contudo, os dois decidem por entrincherar-se ainda mais no grupo, com o objetivo de também tentar desmantelá-lo. Ao agirem desta forma, os dois acabam envolvendo-se perigosamente, colocando suas vidas e as daqueles que os cercam em perigo.
Não sou um fã do seriado original – nunca assisti sequer um capítulo deste que foi um dos seriados mais ícônicos dos anos 80 e possuo conhecimento puramente periférico. Sendo assim, estou impossibilitado de estabelecer qualquer comparação mais aprofundada entre ele e o longa-metragem, seu derivado.
Se o seriado primava pelo estilo e pela produção, construindo estórias envolventes e cheias de adrenalina mas apresentando personagens e situações caricatas e “clichéticas”, então o filme é bastante fiel à sua fonte de inspiração: policiais destemidos que ao se envolverem, sem hesitação, em um cartel poderosíssimo e extremamente perigoso, não demonstram temer, em momento algum, as consequências de tal relação; sexo algo videoclípico e glamourizado; uma cena de combate longa, arquitetada em cada mínimo detalhe. Tudo isso não perfaz, de modo algum, um longa-metragem original e supreendente, constituindo-se, na verdade, em uma abordagem já mais do que vista no cinema e TV. No entanto, apesar de ter montado um filme nada inovador, o diretor explora um pouco mais a fundo as situações e os seus personagens – mesmo sendo eles caricatos -, e suponho que ele tenha feito isso de maneira um pouco mais aprofundada do que algum episódio do seriado original normalmente o faria. Além disso, Michael Mann concebe seu filme de maneira competente, e não recheia o filme de cenas de ação – o que eu vejo como uma decisão acertada -, tentando apenas encobrir um roteiro frágil. Um dos pontos chaves do roteiro de um filme policial são os crimininosos, e estes estão bem representados no filme de Mann: o cartel apresentado no filme é bastante convincente e realista, pois atualiza criminosos que por ventura habitavam o seriado dos anos 80 para aqueles que infectam o século XXI – altamente globalizados, com conexões em diversos países do mundo e agindo de maneira organizada e com o apoio que a tecnologia atual dá à estes. Claro que a idéia de que dois policiais de Miami, com a ajuda de mais alguns colegas, organizando sozinhos uma operação internacional que tem a pretensão de desmantelar um grupo criminoso tão poderoso faz o realismo ficar um pouco mais distante, mas trata-se de uma adaptação do seriado “Miami Vice” – portanto, não havia como não fazê-lo desta forma. A decisão de produzir o filme em vídeo digital, incluindo cenas noturnas que apresentam imagem granulada, com algum ruído bem visível – ocasionado pelo aumento da sensibilidade na captação da imagem no escuro – também foi certeira, pois iajuda a incrementar o estilo do filme e compensa, na composição visual, o realismo perdido pela certa inverossimilhança da operação que é a base do roteiro, e que já citei logo acima.
Deste modo, o filme de Mann não se apresenta como um marco do gênero, mas é, acima de tudo, uma produção requintada que mistura algumas boas idéias de roteiro à outras na identidade estética do longa-metragem. Como filme policial, ele faz o que deve: diverte, explora bem a tensão do expectador e consegue mostrar um bom romance proibido – mas não vai além disso e, como já disse, nem sei se poderia mesmo ir, já que se trata da adaptação de um seriado que também não era muito diferente. E, como isso é Hollywood, mesmo depois de todo o carnaval, temos um final que, podemos ousar dizer, é feliz. E isso, definitivamente, não é nada realista.
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Oliver Stone, além de sua fixação por retratar a guerra – especialmente a do Vietnã – é um biógrafo por excelência – no sentido quantitativo: Talk Radio, The Doors, JFK, Nixon, Evita são todas obras com a direção ou participação de Stone e todas apresentam algum nível biográfico em seu conteúdo. A mais recente figura escolhida pelo cineasta para figurar em sua galeria de personalidades por ele tratadas foi Alexandre, o Grande. Com quase três horas de duração, o filme conta a história de Alexandre de sua infância até sua morte, aos 33 anos de idade, usando como artíficio a narração de Ptolomeu para confecção de uma biografia. Através do uso dessa artimanha, Stone faz sua a voz do narrador para, em alguns momentos, deixar elucidado que há alguns aspectos da vida de Alexandre que não passam de suposições.
Mas a certeza mais clara que surge logo que se começa a assistir o mais recente filme de Oliver Stone é que ele nunca decola. Apesar de ser muito bem produzido e ter boas atuações o longa sofre com dois fatores de certa forma externos ao próprio filme. O primeiro seria o desgaste de filmes épicos como este, onde grande parte da duração da obra é composta por violentas cenas de batalha ultra-realistas e onde muito de sua realização deve aos efeitos digitiais. Essa fórmula já se tornou tão banal no milionário cinema americano que já não serve para garantir o sucesso de filme algum do gênero. O segundo problema seria o próprio personagem de Alexandre: em momento algum do filme a figura do grande conquistador conseguiu me cativar, faltou muito na composição do personagem para gerar a atração necessária. E não podemos simplesmente culpar Colin Farrell pela falta de empatia – ele faz o que pode, dentro dos limites de sua atuação que não é fantástica, mas também não é ruim como insistentemente comentaram -, isso seria simplificar demais o problema. É muito mais um problema de composição do personagem na confecção do roteiro do que de sua intepretação pelo ator: Alexandre aborrece por sua teimosia, insegurança e sua personalidade confusa. Se o objetivo era reforçar estas características para humanizar ou desmisitifcar esta figura histórica o efeito ultrapassou a intenção de seus realizadores e Alexandre acabou por ser retratado como um conquistador de certa forma alienado e caprichoso.
Além de tudo isso, a tão falada bissexualidade de Alexandre que seria por esse filme abordada é tão insípida e heterossexualizada que pode ser considerada mera citação. Não há qualquer ousadia no tratamento da questão – e não estou falando aqui de colocar os atores em intermináves cenas de sexo no decorrer do filme. Falo aqui de um tratamento mais natural da suposta bissexualidade de Alexandre, algo que não foi feito pelo diretor em nenhum momento, apesar da insistência, no plano teórico/retórico, em querer mostrar que isso era encarado com certa normalidade na época.
Ao terminar de ver o filme a impressão que fica é que o maior mérito de Oliver Stone é ter conseguido gastar milhões de dólares e centenas de minutos num filme que gera menos interesse do que um documentário do History Channel. E isso é realmente um feito e tanto.