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Tag: mark-ruffalo

“Ilha do Medo”, de Martin Scorsese.

Atualização: não deixe de ler a ótima resenha que o meu amigo fez sobre o livro de Dennis Lehane, no qual foi baseado o roteiro do filme, que já está online e pode ser conferida clicando aqui.

Shutter IslandAgente federal inicia investigação, acompanhado de seu parceiro, da fuga de uma paciente-presidiária em ilha-prisão para criminosos com desvios mentais.
Martin Scorsese é um dos diretores mais consagrados do cinema, responsável por clássicos absolutos, muitos deles verdadeiras rendições que mapearam a cidade de New York e retrataram seus habitantes e personagens, como foi feito em “Taxi Driver”, “Depois de Horas”, “A “Época da Inocência” e a cinebiografia “Touro Indomável”. Mas o diretor também conseguiu realizar grandes filmes quando deixou de estabelecer território na grande metrópole, como aconteceu ao filmar “Cassino” e “A Última Tentação de Cristo”. Como estes últimos, seu mais recente filme lançado, “Ilha do Medo”, não é apenas mais uma produção em que o diretor aventura-se longe da cidade que por muito tempo foi sua verdadeira musa, mas também reafirma a posição de Scorsese entre os cineastas representativos da história do cinema americano que ainda produzem obras relevantes. Baseado no livro homônimo do autor de “Sobre Meninos e Lobos” – que rendeu um filme irritante de Clint Eastwood -, “Ilha do Medo” é um esplêndido exercício de cinema cujo principal trunfo é o seu roteiro adaptado. É verdade que, por esse motivo, boa parte do que é o filme deve-se à composição da história por Dennis Lehane em seu livro, mas isso não reduz os méritos de Scorsese na transposição deste para a tela. A caracterização dos personagens, a atmosfera construída no filme, a construção de seus cenários e ambientes e as intervenções do cineasta são mais do que suficientes para delegar méritos também ao diretor.
A escolha do elenco, por si só, já foi um grande acerto do diretor, já que ao delegar a Leonardo DiCaprio o papel principal, Scorsese garantiu ao personagem uma atuação soberba de um ator capaz de trazer o misto de credibilidade, perturbação, perplexidade e sensibilidade necessários para tornar crível a sua jornada do início ao fim, aqui consideradas todas as embricações da trama. A seleção dos atores coadjuvantes e de apoio, entre eles Ben Kingsley, Max Von Sydow, Patricia Clarkson e Jackie Earle Haley, também foi de suma importância para incrementar e afinar a história complexa do livro para a materialidade do cinema. A ambientação cuidadosa na concepção de cenários e na escolha de locações é mais um elemento excepcional no longa-metragem de Scorsese: não apenas ela serve de apoio ao trabalho dos atores ao cercá-los em uma reconstituição realista do ambiente e da época como ainda é o instrumento, junto com outros elementos técnicos como a fotografia e a seleção das peças musicais e canções para compor a trilha sonora, que ajudou o diretor a construir a atmosfera de mistério que encobre a maior parte do filme, lhe garantindo o efeito desejado num constante confundir e ludibriar sobre o que de fato ocorreu e está ocorrendo.
A meu ver, porém, é um pequeno detalhe que desnuda toda a qualidade de “Ilha do Medo”: ao fazer com que o personagem de Leonardo DiCaprio conclua o longa-metragem com uma frase extremamente significativa que não está no livro de Dennis Lehane, Scorsese intervém na dinâmica da história de modo espetacular, resumindo, com apenas isto e no último minuto do filme, toda a trajetória do protagonista e dissipando ainda qualquer dúvida que pudesse estar de pé sobre o personagem e a sua trama. O golpe de mestre deixa claro que o longa-metragem não é meramente um jogo narrativo para confundir o público – o que já seria muito bom -, mas uma uma esplêndida história sobre como as pessoas podem enredar-se em narrativas que lhe são necessárias para seguir com suas vidas depois de um evento dramático – não posso ser mais claro na explicação e no uso de adjetivos pelo sério risco de estragar o espetáculo para aqueles que ainda não viram o filme.
Contando com toda a experiência que tem, Martin Scorsese adotou o caminho mais difícil ao não se render à uma adaptação superficial e barata do material que tinha em mãos, evitando tirar proveito de qualquer situação passível de instaurar o suspense pelo susto. Ao invés disso, o diretor americano esquadrinha e torna tangíveis os temores psicológicos da história com uma caracterização sem falhas e um roteiro enxuto e preciso cujas alterações sutis perpetradas apenas aprimoram a essência original da história. Explorando terrores e anseios humanos em uma abordagem instigante, como Alfred Hitchcock fazia magistralmente há algum tempo atrás, Scorsese mostra que Hollywood pode muito bem voltar a deter a tônica da sétima arte, há muito perdida em meio a incessantes – e na maior parte desnecessários – remakes, artifício ao qual ele mesmo se rendeu em “Os Infiltrados” e pensa ainda se render com “Taxi Driver”, e sucessivas sequências de franquias que não fazem jus nem ao seu ponto de partida. Mas à esta última armadilha da indústria do cinema, ao menos, o diretor americano nunca pareceu ter interesse em aderir – e espero que continue assim.

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“Ensaio sobre a Cegueira”, de Fernando Meirelles. [download: filme]

BlindnessUm surto epidêmico de cegueira branca, incurável, atinge uma grande metrópole, despertando nos habitantes um temor que leva o governo a isolar os contaminados. Dentre eles está um médico e sua esposa, a única que permanece imune à estranha doença.
A adaptação de Fernando Meirelles do livro do escritor português José Saramago fascinou o autor da história, mas não agradou muito crítica e público, passando de certa forma despercebido neste ano de 2008, quando não razoavelmente criticado. A reação tem seus motivos: “Ensaio sobre a Cegueira” resultou em um filme com acertos e erros consideráveis, com maior peso para estes últimos.
A estética do filme é já um retrato desta ambivalência: se de um lado a incessante irradiação de tudo com uma aura branca, arquitetada pela fotografia de César Charlone, traz ao espectador o mesmo desespero e temor vivido pelos personagens, que vagam perdidos em um limbo branco, ela também cansa a expectação do filme a certa altura, “chapando” as sensações do público pela utilização excessiva do artifício. A edição também tem sua dose de sucesso e falha: apesar de conceder ritmo e dinâmica às cenas externas, nas tomadas internas ela não consegue obter o mesmo efeito, ainda que mantenha a tensão em um bom nível. Mas as aspectos técnicos apresentam apenas as irregularidades mais visíveis – é onde nasce um filme, no seu argumento e roteiro, que reside aquilo que fez este novo longa-metragem do brasileiro Fernando Meirelles ser celebrado por alguns e ignorado por muitos outros.
A história criada por Saramago no livro “Ensaio sobre a Cegueira”, e aqui adaptada por Don McKellar, instiga enormemente a curiosidade pelas duas idéias que lhe dão partida. Primeiro, a concepção de uma cegueira que não afunda sua vítima em um breu profundo, mas em um reluzente oceano branco, intriga porque parece ser ainda mais agonizante por, teoricamente, não permitir que a pessoa tenha algum descanso, já que ela passa a viver em um estado de vigília visual, por assim dizer, mesmo na escuridão. Segundo, e tão fascinante quanto a anterior, a idéia de apresentar a moléstia como uma epidemia, reservando a somente uma pessoa a imunidade à infecção confere à este personagem tanto uma vantagem sobre os outros quanto um distanciamento destes, afastando-o daquilo que iguala e une todos.
Essas duas características do enredo a princípio provocam interesse no espectador, mas a medida que é promovido o desenrolar do enredo, cada conflito inserido na história faz com que sua originalidade e caráter diferenciador sejam pouco a pouco degradados, sujeitando o enredo à idéias recicladas e lugares-comuns. A longa sequência na quarentena é o seu defeito mais gritante, reduzindo o filme a uma experiência-limite em ambiente fechado que guarda parentesco com as idéias de George Orwell – não à toa, pois José Saramago é comunista rasgado -, o que deixa o filme com um gosto de café requentado. A insistência de Meirelles em reproduzir com esmero esse episódio de “Ensaio sobre a Cegueira” também acaba por torná-lo excessivamente longo, minimizando o impacto das cenas exteriores e deixando espaço até para um epílogo “família de comercial de margarina” – tivesse a sequência de quarentena sido encurtada e o filme encerrado cerca de 20 minutos antes, com a tomada em elevação da procissão desesperançada dos cegos e sua guia por uma São Paulo ainda mais caótica que o habitual e povoada por uns poucos infelizes que jazem confusos pelas ruas, o filme de Fernando Meirelles teria superado a feição de ensaio que carrega já no título.
Baixe o filme, com legenda embutida em português, utilizando o link a seguir.

http://www.megaupload.com/pt/?d=061THWLS

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“Minha Vida Sem Mim”, de Isabel Coixet. [download: filme]

My Life Without MeAnn, uma jovem casada e com duas filhas, descobre, depois de sofrer um desmaio repentino, que tem um tumor em metástase avançada. O resultado: não mais do que dois meses de vida. Tendo em mãos esse prognóstico, Ann decide tomar algumas medidas antes de sua morte.
A partir da idéia do livro de Nanci Kincaid, a diretora Isabel Coixet explora a descoberta, por uma jovem mãe de família, de sua morte iminente e as resoluções, tomadas por ela, a partir desta descoberta. Se caísse nas mãos erradas, a história da jovem que vive em um trailer nos fundos da casa da mãe, que sobrevive como faxineira em uma escola e que casou e engravidou, na adolescência, do único homem com que se envolvera na sua vida, certamente acabaria virando folhetim da pior qualidade, um inevitável dramalhão inundado pelo sentimentalismo mais barato e pela pieguice mais óbvia, que de quebra serviriam como veículo perfeito para a chamada “superinterpretação” do mais ávido candidato à receber uma estatueta dourada californiana. No entanto, nas mãos dessa diretora espanhola, a sensibilidade não é afogada pelo lugar-comum e por um elenco de olho em premiações fáceis. Ao contrário, ela ganha elegância, classe, inteligência e muita delicadeza: ao invés de dar chance à uma tsunami de desespero, sofrimento e amargor auto-inflingidos pela sensação de impotência frente ao destino inevitável, ou mesmo ao seu oposto extremo, ao hedonismo irrefreado, devidamende despertado por uma turnê de experiências inconsequentes na tentativa de viver tudo o que não vivera até então, a diretora-roteirista faz com que a protagonista, antes já uma mulher equilibrada e conformada com sua realidade, mergulhe em um estado de ainda maior compreensão sobre sua situação, que a faz encarar a inevitabilidade e proximidade de sua morte com uma serenidade implacável, dando-se ao direito de derramar apenas algumas poucas lágrimas enquanto busca muito mais reafirmar o que viveu e vive do que saborear novas experiências. E o elenco, composto apenas de nomes modestos do cinema norte-americano, auxilia não apenas pelo seu desempenho na medida exata – particularmente o de Sarah Polley, que voltaria a trabalhar com a diretora no seu próximo longa, já comentado por aqui -, mas também pela credibilidade e verossimilhança que concede aos seus papéis de pessoas comuns – algo muito trabalhoso de ser atingido com as estrelas e astros de Hollywood de beleza perfeita e fama imensa, que dificilmente conseguem imprimir o realismo que um rosto menos popular imprime.
E isso tudo faz a diferença entre este longa-metragem de Isabel Coixet e tantos outros que já vimos sobre os “bastidores” da jornada para a morte de um ser humano: ao invés de explorar a emoção do público como em uma montanha russa, onde todas as sensações parecem intensas mas, na verdade, não vão além de experiências falsas e fulgazes, “Minha Vida Sem Mim” o faz com a mesma sutileza de uma paisagem passageira à janela de um trem em movimento, que deixa em quem a observa sensações bem mais indeléveis e verdadeiras.

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legendas disponíveis (português):
http://www.opensubtitles.com/pb/download/sub/85208
http://legendas.tv/info.php?d=9c43fdcc028f60a6140a133ce467454f&c=1

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“Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças”, de Michel Gondry.

Eternal Sunshine Of The Spotless MindHomem pacato rompe relacionamento com jovem impulsiva e inconsequente, desconbrindo logo depois que ela passou por processo para apagar, efetivamente, qualquer lembrança que tivesse do relacionamento que tiveram. Mesmo inconformado, mas para evitar que sofra ainda mais, ele resolve passar pelo mesmo processo para esquecê-la de uma vez por todas. No entanto, enquanto sofre o “apagamento”, ele acaba mudando de idéia e luta para preservar suas lembranças.
Eu tinha uma enorme implicância com esse filme, evitando por muito tempo assisti-lo por dois únicos motivos: 1) o roteiro do filme é de Charlie Kaufman; 2) o longa conta com a protagonização de Jim Carrey, em mais uma tentativa de mostrar sua competência em um papel dramático. Porém, eu não tinha me dado conta da direção, à cargo de Michel Gondry.
Michel Gondry é mais conhecido pelo seu trabalho na direção de videoclipes, mas resolveu expandir as suas habilidades ao aventurar-se neste longa. Genial, inventivo, mas bastante comedido, Gondry tomou as rédeas da produção e, aparentemente, impôs o seu estilo, polindo, controlando e limitando a personalidade caótica e megalômana tanto do co-roteirista Kaufman quanto do protagonista Carrey. Para o bem de seu filme, a contribuição de Gondry no roteiro do longa potencializa as qualidades do trabalho de Kaufman, e sua direção cuidadosa consegue fazer o que nenhum diretor conseguiu fazer adequadamente até hoje: uma atuação dramática convicente e sensível do comediante Jim Carrey. E a maneira como os personagens conseguem tocar o público não é apenas graças ao excelente desempenho dos atores, mas à atenção do diretor à esse aspecto do filme. Mesmo concebendo seu filme como um exercício de loucura e surrealismo, com excelentes soluções visuais e sequências concebidas para exteriorizar a mente e as lembranças do personagem, Michel Gondry não se deixa vencer pelas suas próprias artimanhas, deixando espaço para que os atores façam o seu serviço e conquistem a simpatia do público. Desta forma, os atores conseguem fazer com que a estória dos seus personagens, bem como a paixão que o casal de protagonistas tem um pelo outro, nunca seja eclipsada pelo argumento idiossincrático do longa-metragem.
“Brilho Eterno de uma mente sem lembranças” surpreende, mostrando que além de um excelente filme que aventura-se por extravagâncias pós-modernas também é um longa-metragem, equilibrado, sensível e tocante, à imagem das melhores comédias românticas americanas. Vamos aguardar pelo próximo trabalho de Gondry, “The Science of Sleep”, que conta com a participação de Gael Garcia Bernal, torcendo para que ele mantenha o equilíbrio de seu trabalho e não se perca como a dupla Jonze/Kaufman fez no irritante “Adaptação”.

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