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Tag: rock

The Cranberries – In The End (download: mp3)

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É difícil não sentir que os versos “do you remember, remember the night, at a hotel in London”, que abrem In The End, álbum que marca o fim da banda irlandesa The Cranberries, estão de alguma forma associados, como uma espécie de presságio do acontecido, com a estúpida fatalidade que tirou a vida da vocalista Dolores O’Riordan em um hotel em Londres. Mas sabe-se que, na verdade, a impressão não passa de uma daquelas bizarras coincidências da vida, e seria tolice permitir que isso interferisse na apreciação das canções do modo como foram idealizadas por Dolores neste álbum que foi finalizado pelos membros restantes da banda (os irmãos Noel e Mike Hogan e Fergal Lawler). Assim pode-se aproveitar devidamente a melodia agitada da bateria sempre firme de Fergal e da guitarra e baixo fluídos dos irmãos Hogan em “It’s All Over Now” tanto quanto se pode desfrutar plenamente o vocal sofrido de Dolores e a melodia sutilmente apoiada por orquestração de cordas, que versa entre a melancolia resignada e a aflição amargurada, em “Lost”.
Dissipada a perturbação, é possível distinguir melhor os acertos e erros do disco – e estes, felizmente, são poucos. É o caso de “A Place I Know”, que figura entre os equívocos por desperdiçar os toques reluzentes no violão que introduzem a canção com um refrão tedioso e sem brilho, e de “Crazy Heart”, faixa promissora que acabou escondida por trás da melodia e vocal apagados – dentre todas as faixas, é a única que deixa realmente nítido que os vocais são fruto de uma sessão de demos e que, provavelmente, este jamais teria sido selecionado como a versão final para a canção.
Mas foi justamente ao se utilizarem de material vocal que não foi originalmente concebido como o definitivo para as canções que Noel, Mike, Fergal, e o produtor Stephen Street conseguiram demonstrar toda a qualidade musical da banda irlandesa, em um excepcional exemplo de competência, devoção e amor pela música. O resultado deste esforço notável são as faixas “Wake Me When It’s over”, que traz vocal e violão em afinada sintonia e refrão denso, recheado com a sonoridade da guitarra e da bateria, “Catch Me If You Can”, com uma intro encantadora que apresenta um piano fugaz e distante, logo solapada por uma melodia envolvente com vocal, orquestração de cordas e bateria carregadas de emoção, e “Summer Song”, que cativa já nos primeiros instantes pela luminosa harmonia entre o vocal de Dolores e a instrumentação posteriormente concebida pelos seus amigos e companheiros de banda.
Inevitavelmente, a agridoce e melancólica faixa-título foi escolhida para fechar o disco e, consequentemente, a carreira da banda irlandesa: “take my house, take the car, take the clothes, but you can’t take the spirit”, canta Dolores com vocal delicado e gracioso sobre violão, baixo e bateria serenos. Os versos talvez soem um pouco piegas, mas a verdade é que, embora o The Cranberries chegue ao seu fim, o “espírito” desta banda – sua sonoridade única e inimitável – jamais vai perecer.

Baixe: https://www.mediafire.com/file/4a59qjgdo35vyzb/cranberries-final.zip

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Fafá de Belém – Humana [download: mp3]

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A brasileiríssima Fafá de Belém, conhecida por sua musicografia genuinamente popular de verve romântica e festiva, aos 62 anos se traja em contemporaneidade, elegância e arrojo musical com o disco Humana. Sob a batuta do produtor Zé Pedro (muito conhecido do tempo em que era DJ do programa Superpop, versão Adriane Galisteu) e direção artística de Arthur Nogueira a partir da concepção da artista paraense, o disco de dez faixas apresenta composições originais e gravações com melodias coletivamente concebidas pelos músicos da banda. Tirando um par de faixas que não parecem se encaixar no projeto (“O Resto do Resto”, que não empolga com seu arranjo de MPB blasé, e “Eu Sou Aquela”, que apesar da qualidade das letras, tem arranjo cansativo, soando repetitiva por não diferir do que a intérprete já fez anteriormente ao longo da carreira), o disco é uma lufada de frescor no atual cenário musical brasileiro, cujos artistas, tanto os consagrados e veteranos da MPB (que jocosamente costumo chamar de “aristocracia artística”) quanto novatos estão mais preocupados em fazer panfletarismo político-ideológico do que música, e mesmo quando resolvem fazê-la, esta é inevitavelmente transformada em panfleto, que se não é algo bastante oportunista, no mínimo é cafona e datado, com prazo de validade fatalmente determinado. Deste modo, mesmo que alguém possa ler a divertida faixa “Alinhamento Energético” (com letras deliciosamente debochadas da artista indie Letrux e recebendo aqui um tratamento de primeira da banda, com bateria requebrada e guitarra e teclado inspirados) como tendo algum posicionamento desta ordem (em poucos dias desde o lançamento de Humana, muita gente já correu pra fazer essa interpretação míope do disco), não se encontra fundamentação alguma para tanto que não seja a vontade de fazer esta leitura, e ainda que esta fosse verdadeira, a despeito disso a faixa reteria todo seu charme e inteligência, diferentemente das “músicas de protesto” concebidas tanto por medalhões da MPB quanto por artistas independentes desde meados do ano passado que, via de regra, tem qualidade sofrível (e estou sendo bem gentil, na verdade são medíocres). E, olhem, Fafá não veio mesmo ao mundo a passeio, como se pode perceber na faixa de abertura do disco, “Ave do Amor”, composição original de Ana Rocha em parceria com o diretor artístico de Humana: iniciando com toques acetinados no piano, a faixa logo ganha ímpeto pelo toque firme na bateria e contornos de indie rock devido ao trabalho genial da guitarra e baixo. O rock, por sinal, é a alma de outra das gravações originais do disco: “O Terno e Perigoso Rosto do Amor”, criada por Adriana Calcanhotto a partir do poema homônimo de Jacques Prévert, esbanja volúpia blues rock para ficar em pé de igualdade com o vocal de Fafá, transbordante de ardor e sensualidade. Porém, em “Eu Não Sou Nada Teu”, de autoria de Zé Manoel, pianista do álbum, Fafá encobre seu vocal no retrato mais fiel da dor, concedendo ao público uma interpretação soberba e impecável em versos como “pois a ausência dos vivos é pior de aguentar, morre em minha vida, como meu pai o fez, doce é a despedida de quem se vai de vez”.
A artista paraense e sua banda, porém, não capricharam tão somente nas faixas lançadas originalmente neste disco, as reinterpretações de músicas já conhecidas (ou nem tanto) também receberam igual atenção e dedicação, como “Revelação”, sucesso conhecido na voz do cearense Fagner. Na versão de Fafá, vocal e melodia transitam entre delicadeza, furor e introspecção. “Não Queiras Saber de Mim”, regravação de música do cantor português Rui Veloso, surge aqui triste e amargurada, com piano doce e frágil e bateria e guitarra recolhidos. “Dona do Castelo”, originalmente cantada por Jards Macalé e muito conhecida na gravação de Adriana Calcanhotto, prossegue no clima tristonho, mas tanto a bateria quanto a forte interpretação da paraense se sobrepõe firmemente ao restante do instrumental. E apesar de a versão de Fafá para “Toda Forma de Amor” não fugir do usual das reinterpretações de clássicos de Lulu Santos, já que preserva a atmosfera pop/rock que é a característica do cantor brasileiro, é compreensível que assim tenha sido feito para fechar este belo projeto com todo o gás, com a cantora cantando a plenos pulmões “eu não nasci pra perder, nem vou sobrar de vítima das circunstâncias”. De fato: Fafá, que sempre foi discretamente colocada de escanteio tanto pelos ditos intelectuais da academia quanto pela elite artística do país como uma artista menor por ter trafegado essencialmente pelos caminhos da legítima música popular, deixou quaisquer lamentações de lado e meteu o pé na porta para melar o clubinho da aristocracia artística brasileira, que está muitíssimo ocupada em vomitar demagogias ideológicas para retroalimentar suas vaidades na modorrenta e patética disputa de quem é mais politicamente engajado, e se colocar como a dona daquele que é possivelmente o melhor disco brasileiro do ano – o público, que está sedento por música de qualidade acima de qualquer outra questão, Fafá, agradece.

Baixe: https://www.mediafire.com/file/tn9ajk07a5ud3l6/belem-humana.zip/file

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Liily – I Can Fool Anybody In This Town (EP) [download: mp3]

No EP de estréia I Can Fool Anybody In This Town, os cinco jovens de Los Angeles que formam a banda Liily deixam claro que bastam bateria, baixo e guitarra para fabricar melodias arrebatadoras, como “Toro”, que abre o disco disparando um refrão grudento no qual o instrumental explode em uma orgia sonora, e “The Weather”, onde o vocal, as supressões instrumentais, os acordes sinuosos e cortantes de guitarra e a bateria encorpada e possante sopram um vento, assim, Arctic Monkeys. E por falar na banda britânica, “Sepulveda Basin”, além de ser um respiro momentâneo da tônica acelerada do disco, poderia facilmente emplacar sua bateria, baixo e guitarras graciosas em Humbug, o disco que marcou a guinada sonora dos jovens ingleses para um rock mais melódico. “I Can Fool Anybody In This Town”, faixa título do disco, tem como destaque a parceria entre guitarra e bateria em um compasso curto e vívido, ao contrário de “Nine”, que mantém a aceleração, mas reflete na melodia a mesma aflição de versos como “what if I can’t bleed when I cut with your razor?”. A banda conclui o EP com o vocal rascante, a guitarra afiada e a bateria intensa de “Sold”, uma faixa vibrante na qual a banda demonstra que, mesmo ainda sendo novata na abarrotado cenário do indie e do rock alternativo, possui toda a auto-confiança das veteranas.

Baixe: https://www.mediafire.com/file/bd4psoscjfv4qwd/liily-fool.zip

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Julia Jacklin – Crushing [download: mp3]

Com seu segundo álbum, Crushing, lançado semana passada, a australiana Julia Jacklin ainda é uma novata no meio musical, tendo confessado que só em meados de 2016 se deu conta que a música tinha se tornado sua principal ocupação, já que pouco tempo lhe sobrava para seu emprego “tradicional”. Apesar disso, a garota parece ter adquirido maturidade artística suficiente para compor algumas faixas de imensa beleza, caso de “When The Family Flies In”, uma elegia tocante de vocal sofrido e piano abafado que recorda a triste banalidade dos últimos momentos na companhia de um amigo que se foi, e da faixa “Comfort”, que fecha o disco com a simplicidade de um violão de tonalidade folk e um vocal desconcertantemente resignado onde Julia trata sobre alguém que, após abandonar uma relação, tenta se convencer que seu ex-companheiro está bem – como ilustra o verso “don’t know how he’s doing, but that’s what you get, you can’t be the one to hold him when you were the one who left”. “Body”, faixa de abertura e single do disco, é outra amostra da qualidade musical que a australiana já atinge: com um vocal letárgico em letra episódica sobre uma mulher que decide abandonar um relacionamento que percebe não ser saudável e uma melodia enxuta baseada em uma harmonia quase imutável de bateria e baixo e um discreto piano na sequência final, Julia captura a atenção do ouvinte desde o princípio, fatalmente enlaçando-o na cadência melancólica e algo soturna da canção. Há, no entanto, como encontrar no disco tecituras de outros gêneros, como a leve coloração country nas guitarras e na bateria da balada “Don’t Know How to Keep Loving You”, na qual Julia fala de uma paixão que foi exaurida pela convivência de um casal, e o pop/rock moderadamente ritmado da guitarra, baixo e bateria em “You Were Right”, onde, após o término de uma relação, uma mulher confessa ter prazer em desfrutar de todas as coisas então recomendadas por seu companheiro, mas que nunca experimentara por contrariedade à forma insistente que ele as fazia.
No entanto, a australiana ainda é uma artista em formação, e por isso é compreensível que boa parte de suas composições ainda soem tanto opacas (caso de “Head Alone”, com guitarra e bateria abatidos e vocal pouco inspirado, e de “Good Guy”, faixa com instrumental de toques espaçados e um vocal sem brilho em que Julia suplica pela atenção de um rapaz que claramente não tem o mesmo interesse) quanto irregulares (como “Turn Me Down”, que inicia desprovida de ânimo até reverter-se em um frenesi melódico onde a cantora solta a voz sem receios, mas consciente de suas limitações). Ainda assim, o saldo final é compensador, e pelo que se observa nas melhores canções do disco, com mais alguns pés na bunda que a garota dê ou leve, quem sabe, poderemos ter um “breakup album” genuinamente rock n’roll.

Baixe: https://www.mediafire.com/file/mrpceg0zigq6u64/jacklin-crush.zip

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Isaac Gracie (LP) e Close Up – Looking Down (EP) [download: mp3]

Acabei conhecendo Isaac Gracie através do vídeo do seu single “The Death of You & I”, e apesar do o clip não ir muito além do clichê mais batido possível do rock, com o jovem músico britânico destroçando tudo o que vê pela frente, é impossível não ficar impressionado com a voz ao mesmo tempo macia e potente do jovem dândi. A canção, por si só, também é irresistível, com bateria e guitarras que transitam entre um bolero tépido e o ardor de um rock furiosíssimo onde o jovem britânico solta sem receios a sua voz potente. O disco homônimo que contém a canção, porém, ainda guarda outras belas canções. “Terrified”, a faixa de abertura onde o cantor inglês expõe seus temores de não corresponder as expectativas de alguém que ama, adiciona na família de instrumentos um piano de toques suaves que banha a linda voz de Isaac de modo – perdão do trocadilho – gracioso. “Last Words”, logo em seguida, é uma balada com vocais de fundo e orquestrações que acolchoam os acordes melancólicos do violão do jovem músico que canta sobre alguém que, depois de abusar de sua sorte, pergunta-se como pode ter se permitido chegar à este ponto. Logo depois de “Running On Empty”, gostosa faixa de ritmo acelerado, na tradição do pop/rock inglês, temos “Telescope”, onde o cantor, com vocal, violão e pianos sofridos e bateria bem marcada, canta sobre um amor que percebeu não lhe fazer bem, e do qual agora que se desfazer. “That Was Then”, com uma melodia triste e bem ritmada da guitarra, baixo e bateria sobre a voz em tom penoso de Isaac, investe ainda mais em romances disfuncionais em letras como “she says I’ll never understand, begging me to let her go, if you never lose, will you ever know how to be a better man”. Em “When You Go”, o violão de sutil cadência matinal constrói um lamento que casa perfeitamente com as letras sobre mais um amor disfuncional. Amores despedaçados também são tema de “Silhouettes Of You”, onde o violão e a vocalização de fundo do refrão são a base para um crescendo instrumental da bateria e guitarra que incrementa o flagelo vocal de Isaac. Algumas faixas mais à frente, fechando o disco, a música de “Reverie” alterna entre a prece sorumbática da guitarra, percussão, piano e vocais abatidos e a pujança sonora em sua sequência final, em um deslumbrante despertar melódico.


Porém, se a tônica do LP de estréia é de uma melancolia cálida, Close Up – Looking Down, o EP lançado no final do ano passado, reúne canções mais ritmadas, com uma energia pop/rock que o cantor e seu produtor aparentemente decidiram resguardar em grande parte do disco de estréia. “Show Me Love”, uma faixa clássica do gênero com um andamento rápido da bateria e guitarra acompanhando um vocal mais solto e intenso do cantor britânico, deixa isso claro já na abertura do EP, ainda que a faixa seguinte, “Broken Wheel”, desacelere um pouco com sua harmonia mais cadenciada do violão, percussão e piano sobre um vocal que conserva o mesmo vigor da faixa anterior. “No, Nothing at All” é a faixa mais bem estruturada do disco, onde a guitarra e a bateria bem compassadas preparam-se para um refrão onde ganham uma maior densidade instrumental que lembra os inesquecíveis hits das rádios FM do início dos anos 90. “You Only Live Once”, cover de uma faixa do The Strokes calcada nos alicerces do rock, conclui o pequeno compêndio musical desacelerando o ritmo com a parceira perfeita entre guitarra, bateria e vocal em uma versão mais contemplativa, mas que também convida o corpo a embalar-se em seu compasso manso e sereno.
É uma grata surpresa ainda encontrar bons e jovens artistas interessados em desnudar seus sentimentos e devassar seus corações ao ritmo do velho, bom e insuperável rock. O filão mais popular da música mundial, aquele que ganha todos os holofotes, está tomado por artistas cujo trabalho se assemelha tanto a ponto de você não encontrar algo que os diferencie, num pastiche sonoro que parece ter sido fielmente elaborado pelos produtores baseados em algoritmos que apontam inequivocamente aquilo que vai capturar a atenção da massa de ouvintes, mas o rock sobrevive, ainda que ele esteja discretamente alojado lá na mesa do canto da cafeteria, calma e pacientemente degustando um café, esperando todos aqueles que tem bom gosto e inteligência sentar em sua mesa para apreciar a sua companhia.

Baixe (Isaac Gracie, LP, 2018): http://www.mediafire.com/file/h9itucp2kq5za07/gracie.zip

Ouça (Extended Edition, inclui 3 faixas do EP):

Baixe (Close Up – Looking Down, EP): https://www.mediafire.com/file/s8towi6llyssbfx/gracie-up-down.zip

Ouça (faixa “You Only Live Once”):

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Sol Seppy – The Bird Calls, and Its Song Awakens the Air, and I Call (EP) [download: mp3]

Se você acha que Fiona Apple é a mais reclusa e obtusa artista que se conhece é porque nunca ouviu falar de Sol Seppy. Pra se ter uma idéia, seis anos se passaram desde The Bells of 1 2, o imensamente belo álbum solo de estréia de Sol Seppy, e desde então, a única coisa que a talentosa artista concedeu ao público foi uma faixa (“I Am Snow”) para a compilação Love Cartier (que conta, inclusive, com uma canção da atriz francesa Marion Cotillard), lançada em 2008. E, diferentemente da cantora americana, que deu toneladas de entrevistas para o lançamento neste ano do seu álbum, até hoje muito pouco se viu, leu ou ouviu da cantora britânica de origem grega (seu nome verdadeiro é Sophie Michalitsianos) que não fosse suas músicas. Até mesmo fotos da moça não passam de alguns punhados que se encontra na internet. Apresentações ao vivo e vídeos? Esqueça são ainda menos numerosos que imagens. Ao que parece, a artista trabalha no seu ritmo, sem se preocupar com a frequência de lançamentos estabelecido como padrão pela indústria da música ou com a panacéia de ritos necessários para se chegar ao conhecimento púlico ou para mantê-lo. Por conta disso, só fiquei sabendo há poucos dias que a cantora deu o ar de sua graça em fevereiro deste ano para lançar um EP de apenas três faixas. Parece pouco, mas para o seu público, sedento há anos por alguma de suas composições tão singulares, já é motivo suficiente para se comemorar. As três canções foram nomeadas de forma que compõe um verso, “Part of/ Music/ Live in Me”, o que já indica a sua semelhança na tonalidade melódica: todas lidam com não mais do que piano, violão e violoncelo para tecer as harmonias delicadas, etéreas, difusas e distantes que marcaram a maior parte das composições do disco de estréia da britânica. De uma melancolia não propriamente triste, mas reflexiva e contemplativa, as faixas são pontuadas e atravessadas por silêncios profundos e tão significativos quanto a própria melodia, o que permite ao vocal sempre calmo e terno, que por vezes ecoa longínquo e abissal e em outras familiar e reconfortante, elevar-se sob a frágil tecitura musical que lhe serve de acompanhamento. A única coisa ruim que fica do lançamento deste pequeno EP (além da capa, que resolvi ignorar e criar outra um pouco mais interessante) é a impressão de que com ele a profundamente talentosa artista se dará por satisfeita por mais um longo período sem lançar qualquer outra coisa. Vamos torcer para que isto não passe de uma impressão e tenhamos logo uma fantástica surpresa reservada para breve.

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Menomena – Moms [download: mp3]

Menomena, a agora dupla de Seattle, depois da partida de Brent Knopff para se dedicar ao seu projeto Ramona Falls, segue seu caminho sem esmorecer pela saída de um dos membros, já que Moms, o novo disco da banda, foi gestado com uma rapidez considerável para o histórico dos rapazes de Portland. O primeiro trabalho em que Justin Harris e Daniel Seim trabalham sozinhos é um disco que apesar de manter a mesma energia que estamos acostumados a esperar nas composições da banda traz harmonias que estão na maior parte do tempo mais focadas do que no álbum anterior. Porém, o grande diferencial de Moms, que o coloca como o divisor de águas na carreira da banda são as suas letras: com a saída de Knopff, pela primeira vez Harris e Seim permitiram-se abordar temas mais íntimos para si próprios, inquietações altamente pessoais, mas também enormemente universais, como a família, o envelhecimento e a morte. Em outras palavras, é um disco mais maduro liricamente e emocionante como nunca antes a banda se deu o direito de ser. “Pique” é um exemplo, com a intensidade da percussão, piano e baixo, os acordes vibrantes da guitarra e o saxofone em participação impecavelmente espetacular acompanhando Justin Harris desmanchando sua alma no vocal ao descortinar de modo amargurado a sua criação sem a presença do pai, que o abandonou logo cedo: “now I’m a failure, cursed with male genitalia, a parasitic fuck with no clue as to what men do, impossible to love”. Mas é difícil, se não impossível, a tarefa de apontar a canção mais emocionante do disco, já que em “One Horse”, onde a banda pela primeira vez emprega o uso de orquestrações na melodia, Seim acompanha a letárgica melancolia do piano e a sôfrega harmonia de violinos e violoncelos despedaçando o coração ao cantar com uma crueza impressionante a perda da mãe quando ainda adolescente: “I had a mother who swam in your streams, I know the ending, yet I’m faking suspense, more fertilizer for the trees”. “Heavy is as Heavy Does”, cantada por Harris, é mais uma ode ferina à desestruração familiar, onde versos como “as powerfull as a man he was, pride my father never was of me” são acompanhados por um piano em cadência imutável, enquanto aos poucos crescem guitarra e bateria que explodem em uma orgia sonora desesperada no marco dos 2 minutos e meio.
Contudo, as canções de Moms não chafurdam apenas o sofrimento e o rancor como um lamento. Apesar do abandono e solidão serem temas constantes, nem sempre eles são acompanhados por melodias tristes e resoluções amargas, como em “Plumage”, que abre o disco com palmas, piano, guitarra e bateria em vibrante comunhão, incluindo um solo de saxofone bem à moda da banda, enquanto Harris compara a dança do acasalamento das aves com a sedução de uma mulher que acaba grávida e sozinha – uma referência clara à situação de sua própria mãe. Outras faixas que não deixam os versos agridoces afetar a melodia são “Capsule”, cuja bateria sincopada é marcada por solos ásperos de guitarra e breves toques ao piano que se sobrepõem à observações precisas sobre viver tendo perdido quem se ama (“while i’m evolving from a child to an aging child you’re maturing from a memory to a legacy”), “Skintercourse”, com Harris cantando o amor e a invevitável dependência e repúdio que costumam acompanhá-lo ao mesmo tempo que guitarra, baixo, piano e bateria alternam-se, misturam-se e apoiam-se ao melhor estilo da banda, “Giftshoppe”, com sonoridade profusa onde todos os instrumentos mesclam-se em uma espiral melódica e onde Seim divaga sobre seu amadurecimento enquanto caminha para os 40 anos (“you perverted aging fuck, what age did your mind get stuck?”), “Tantalus”, também com uma composição cíclica típica da banda, cuja base está na cadência trabalhada, re-trabalhada e subvertida muitíssimo bem por Daniel na bateria enquanto piano, guitarra e teclado intervém na síncope percussiva e as letras refletem sobre a inevitabilidade da morte, a percepção da efemeridade da vida e do que foi feito até então dela (“volcanic dirt stains feet and won’t wash out of clothing, this is where your ashes should be strewn instead of some cold mainland suburb”). No fim, a saída de Brent Knopff não apenas fez bem ao Menomena, como até ouso dizer que foi necessária para o crescimento dela: se antes o trabalho da banda seduzia os fãs pela sua energia e vibração na mais pura celebração hedonista, agora ela os conquista e arrebata por não mais evitar revelar que aqueles garotos são na verdade tão humanos quanto eles próprios, sujeitos assim à sofrer com os mesmos sentimentos de revolta e perplexidade diante da enorme confusão que não poucas vezes a vida mostrar ser.

http://www.mediafire.com/file/dj7twf948mowb5m/mem_-_moms.zip

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Menomena – “Heavy is As Heavy Does” (single)

Duas notícias para os que, como eu, são fãs dos rapazes de Portland da banda Menomena, uma ruim e outra boa. A ruim, que nem é notícia por ser já um tanto velha, é que um de seus três componentes, Brett Knopf, deixou a banda para dedicar-se ao seu projeto particular, Ramona Falls, depois de não conseguir mais se entender com os companheiros Justin Harris e Daniel Seim. Apesar de inicialmente nutrirem dúvidas se deveriam ou não seguir juntos, ambos chegaram a conclusão de que valeria a pena tentar. E aí é que temos a notícia boa: Moms, o novo álbum da agora dupla de Portland, será lançado dia 18 de Setembro. A partida de Knopf abriu a possibilidade para a dupla remanescente enveredar por um trabalho mais pessoal, sem receios de destrinchar intimidades particulares, daí o nome do álbum, que é focado em experiências e histórias relativas à vivência de ambos e de suas respectivas famílias. “Heavy is as Heavy Does”, uma das faixas do novo disco, foi liberada hoje e já dá aos fãs um pequeno aperitivo de qual será a musicalidade da banda, agora que Seim e Harris podem trabalhar de modo mais focado. A bem da verdade, ela não difere muito da musicalidade mais harmoniosa e menos esquizofrênica de parte das faixas de Mines, o disco anterior: um piano em registro baixo revira ciclicamente os mesmos acordes enquanto versos como “Heavy are the branches hanging from my fucked up family tree, and heavy was my father, a stoic man of pride and privacy” descortinam a intimidade de Justin Harris sobre uma percussão mais organizada e solícita – mas apesar do saxofone hipnótico do Menonema que todos amamos não desempenhar mais do que um papel pontual nesta nova música, um solo rascante de guitarra e uma bateria ensandecida não se fazem de rogados e transbordam no outtro melódico da faixa – bom saber que os rapazes ainda tem gosto por estripulias.

Menomena - "Heavy Is As Heavy Does" (Audio)

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Fiona Apple – The Idler Wheel… [download: mp3]

Reza a lenda que a primeira versão do 3o disco de Fiona Apple, Extraordinary Machine, jamais viu oficialmente a luz do sol porque os executivos da gravadora Sony/Epic o acharam sem qualquer apelo comercial, e por conta disso, o disco, em boa parte remodelado, só foi lançado dois anos depois – e isso graças à uma intensa mobilização dos fãs. Fico curioso imaginando o que os atuais executivos da gravadora pensaram ao ouvir o novo disco da cantora, The Idler Wheel. Se a primeira versão de Extraordinary Machine, com suas orquestrações transbordantes, baterias imponentes e pianos retumbantes foi avaliada daquele modo por eles, o que dizer de um disco tão, mas tão seco que pouco se pode notar da presença de um baixo, quem dirá de uma guitarra? Só posso pensar que eles não ouviram o disco. Ou vai ver os novos chefes do selo musical são mais afeitos à uma cantora que dispensa um produtor musical e se deixa aventurar em melodias enormemente despojadas e improvisadas em companhia apenas do seu novo comparsa, o baterista Charlie Drayton. Afora algumas pequenas, pontualíssimas inserções de alguns instrumentos – como celestes – em participações tímidas, todas as melodias do disco se apoiam em percussão, muitas vezes produzida de modo nada ortodoxo, e no piano da cantora – que nem mesmo aparece em todas as faixas. É uma abordagem bastante radical, embora esse caminho faça algum sentido depois de Extraordinary Machine ter se despido melodicamente de sua primeira versão, produzida por Jon Brion, para a segunda, a cargo de Mike Elizondo e Brian Kehew. Por conta disso, mesmo já tendo sido preparados com o lançamento de algumas músicas do disco na internet, os fãs certamente vão estranhar o primeiro contato com o álbum, já que canções como “Daredevil”, com sua percussão ao mesmo tempo frenética e discreta como o bater de asas de um beija-flor, o piano de toques espaçados e o vocal esquizofrênico no refrão, “Jonathan”, com pianos mais oblíquos até do que se poderia esperar da cantora e com percussão e ruídos mecanizados que lembram o trabalho de Björk em algumas faixas de Selmasongs, “Left Alone”, com uma jam session solo de bateria, piano impromptu e sequências vocais inesperadas e “Periphery”, com piano de acordes minimalistas e sample do que parece ser um calçado sendo esfregado em um tapete, entram um tanto quadradas no ouvido – mas há chances de que eles sejam amaciadas um pouco mais em posteriores audições.
Isso não quer dizer, porém, que o minimalismo preponderante resulte apenas em canções difíceis que necessariamente precisam de algum tempo sendo processadas nos tímpanos. Várias faixas igualmente espartanas já caem no gosto de pronto, caso do já conhecido single “Every Single Night”, com suas cintilações delicadas onde a cantora declara o frágil equilíbrio de um relacionamento amoroso nas letras ao afirmar “the rib is the shell, and a heart is a yolk,…and if we had a double, king-sized bed, we could move in and I’d soon forget”, do harmonioso piano solo de “Werewolf”, que ao ser aberta com os versos “I could liken you to a werewolf the way you left me for dead, but I admit that I provided a full moon” revela como a cantora amadureceu sua visão sobre relações amorosas, de “Regret”, faixa onde a cantora solta a voz num refrão bem ao seu estilo, cantando “I ran out of white dove feathers to soak up the hot piss that comes through your mouth every time you address me” com a já sua característica verve furiosa, de “Anything We Want”, que soa melodicamente familiar, já que a percussão mais encorpada que acompanha o piano lembra bastante o trabalho de Jon Brion ao lado da cantora, e da divertidíssima canção que fecha o disco, “Hot Knife”: o trabalho conjunto da percussão ritmada, do piano de cabaret e dos vocais em coro no refrão, junto com metáforas de caráter ambíguo como “If I’m butter, then he’s a hot knife, he makes my heart a cinemascope, he shows me the dancing bird of paradise”, fariam Fiona Apple entrar no palco de um musical da Broadway com a confiança de uma corista experiente no ramo – e esta é exatamente a palavra que define este disco, tanto para a artista quanto para seus admiradores: só uma artista em uma fase bastante segura de si poderia produzí-lo; em contrapartida, só o tempo vai dizer se com o despojamento de The Idler Wheel os fãs continuarão seguros de toda admiração que tem por ela. Eu acredito que alguns corações podem ficar estremecidos, mas ao final, mesmo que esse não seja no seu todo o disco que os fãs esperaram tanto tempo, é uma obra tão sincera e intensamente pessoal como nunca Fiona havia feito – algo que raramente se vê hoje em dia, infelizmente.

http://www.mediafire.com/file/unbamvuur59ov1k/apple-idle.zip

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Soap&Skin – Narrow [download: mp3]

Soap and Skin - Narrow

Apesar do aspecto ligeiramente mais harmonioso do que na capa de Lovetune for Vacuum, primeiro disco da austríaca Anja Plaschg, a expressão mais uma vez melancólica da garota indica que no seu segundo disco sob o pseudônimo Soap&Skin, Anja continua a decantar a dor com sutis lampejos de contentamento. A impressão que se tem ao ouvir Narrow é que desta vez a artista austríaca compôs melodias mais mais polidas e menos afeitas à experimentações com ruídos obscuros e sintetizações iluminadas, como é o caso da faixa de abertura, “Vater”, cantada em alemão: o eletronismo gótico fica restrito à sequência final da canção, já que grande parte da melodia está calcada em vocal e piano em puro virtuosismo melódico com algumas orquestrações de cordas aqui e ali para aprofundar o efeito da música. A impressão, no entanto, não corresponde exatamente à verdade, uma vez que este segundo disco da artista européia é consideravelmente menor do que o primeiro, contando com apenas oito faixas, e lida com o mesmo material melódico e emocional do primeiro: tanto em “Deathmetal” quanto em “Big Hand Nails Down”, por exemplo, temos a intensa metalurgia melódica complexa e obtusa que beira o atonal que já se tornou marca registrada da compositora, a primeira acompanhada por um órgão igualmente insólito e um vocal de múltiplas camadas de um tonalidade obscura e a segunda atravessada por um registro vocal potente e cortante. Ao mesmo tempo, há neste pequeno disco faixas com exibem a mesma faceta terna e delicada que se pode conferir no primeiro disco, caso da soturna melancolia ao piano de “Cradlesong” e de “Wonder”, que além do piano triste conta com um órgão e sintetizações sutilíssimas em harmonia algo reflexiva e vocais de apoio de um coro gospel em registro singular que subverte consideravelmente sua identidade costumeiramente sacra. Não poderia faltar uma canção que reúna todas as predileções melódicas de Anja, e esta é o single “Boat Turns Toward the Port”, que conta com piano elétrico de acordes espaçados e órgão fluído e distante sobre o singelo loop de um sample do que parece ser uma antiga caixa registradora e vocais em plena extensão harmônica, tendo como resultado uma paradoxal atmosfera contemporânea e nostálgica. E por falar em nostalgia, Narrow conta ainda com um cover do clássico do eurodance “Voyage Voyage”, faixa da francesa Desireless que foi um dos marcos do pop dançante borbulhante de sintetizadores que embalou Europa e recantos do Brasil no final dos anos 80 e início dos 90. A versão da austríaca, claro, é embebida em seu soturnismo particular, transmutada em piano, orquestração de cordas e vocais encobertos de amargura, mas também preserva e transforma em sua a melancolia que a faixa já detinha originalmente. Ao que parece, Anja não consegue resistir esquadrinhar a tristeza mesmo quando envereda pelos cânones do pop – e espero que ela não deixe de fazê-lo tão cedo.

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