Qualquer crítica deve ser feita baseada em fundamentação lógica e bom senso. No entanto, isso não parece ser a regra e sim a excessão na discussões formadas na internet – e, na verdade, fora dela também. E tem gente que, só para alimentar a sua egolatria, adora lançar opiniões polêmicas, evidentemente que vão contra a opinião da maioria e que, como eu já disse, carecem de relevância. Nas minhas raras idas ao Orkut – que não é definitivamente o que mais adoro fazer na web – acabo conferindo inúmeras situações como esta. A mais recente, com a qual tive contato hoje, aconteceu numa comunidade sobre “Lost”. Um indivíduo, se julgando muito inteligente e perspicaz, entra na comunidade e inicia um tópico afirmando que todos não passam de idiotas por idolatrar um seriado americano e não valorizar a produção brasileira que, segundo ele, seria infinitamente melhor por retratar a nossa realidade, e usou como exemplo o seriado “Cidade dos homens”.
Lindo isso. Não passa de sandice vazia. Explico. O fato de que existem boas produções brasileiras não tira o mérito das produções estrangeiras – para qualquer pessoa minimamente inteligente, é óbvio que uma coisa independe da outra. Mesmo as pessoas que não curtem a produção brasileira de séries ou similares – e eu, por exemplo, não consigo lembrar de nenhuma que vale realmente a pena, nem a citada por ele – sabem admitir isso como um fato. Agora, o que deve também ser admitido é que os americanos fazem os melhores seriados do mundo, quer os brasilianistas de plantão gostem ou não disso.
Há ainda a questão que reside na diferença conceitual e temática entre as duas séries: “Lost” é pura ficção que explora mistério e causa suspense; “Cidade dos homens” pretende retratar a realidade das classes sociais mais baixas do Brasil. Isso só basta para tornar qualquer comparação ou discriminação entre as séries sem efeito.
Deve-se evitar o discurso nacionalisto barato. O fato de a produção ser brasileira não faz dela um primor; assim como o fato de que a série aborda a realidade nacional não faz necessariamente desta uma obra relevante ou mesmo lhe confira qualidade. Isso é cretinice ufanística. “Lost” é uma das coisas mais genais já criadas pela televisão americana, entrando desde já para o panteão das séries inesquecíveis – como “Arquivo X” e “Jornada nas Estrelas” -, e não há qualquer coisa produzida no país que se equipare a esta série norte-americana. “Cidade dos homens” é um derivado do longa de Fernando Meirelles encomendado pela Rede Globo para aproveitar o sucesso do filme. A citada série pode até mesmo ser boa, mas está anos luz de se configurar como um marco. E ponto final.
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Sucedendo a 4ª temporada de “24 horas”, “Lost” estréia na Rede Globo no mesmo horário infame de sua antecessora. Tratadas como simples solução para ocupar o horário do apresentador Jô Soares durante suas férias, a mais popular televisão do país não sabe fazer uso do que tem em mãos: tanto a série produzida pela Fox quanto pelo canal americano ABC são sucesso absoluto em seu país e são exibidas, com justiça, em horário nobre. Porém, seriados estão para os americanos como as novelas estão para os brasileiros. E enquanto aqui as TVs tentam enfiar garganta abaixo produtos que se repetem uns aos outros sucessivamente e que tem exibição inédita diária – daí a impossibilidade de qualidade -, nos Estados Unidos o produto tem exibição semanal e ideías que se não são absolutamente inovadoras tem, ao menos, a virtude de as reciclar muito bem. É o caso de “Lost”: depois de um desastre aéreo, os sobreviventes, perdidos numa ilha oceânica, tentam levar em frente à vida tendo que lidar uns com os outros – até então meros desconhecidos entre si -, enfrentando a possibilidade de que talvez nunca sejam resgatados e, aí está o pulo do gato da série, convivendo num ambiente sinistro, que é palco de eventos inexplicáveis.
Essa é a mistura bem costurada de séries como “Arquivo X”, e da dinarquesa “The Kingdom” – na qual se inspirou Stephen King para a versão americana, “Kingdom Hospital” -, com uma ambientação tropical e uma vestimenta Robson Crusoé. Não dá para chamar o resultado disso de simples cópia, trata-se muito mais de um produto novo, derivado da inspiração de inúmeras outras idéias. E o resultado é fenomenal: elenco ideal – que mistura estreantes e veteranos, que é o caso do gatíssimo e excelente ator Matthew Fox -, produção que se esmera no capricho, direção exata, roteiro preciso. É a irmã mais rica de uma supreendente “tsunami” de séries de conteúdo excepcional – como “House”, “Nip/Tuck”, “Desperate Housewives” e a já citada “24 horas”), depoia da “aposentadoria” de séries veteranas de qualidade, como “Arquivo X” e “Sex and the City”. E é um mérito da obra conseguir sacudir até o seu público cativo – o viciado em cinema e seriados, como eu.
“Lost” superou todas as minhas expectativas, pelos já citados motivos e também por conseguir criar momentos de tensão absoluta sem apelações: um exemplo disso foi a cena final do episódio piloto duplo: alguns do personagens reunidos no topo de um morro e ouvindo uma mensagem absolutamente sinistra e enigmática num comunicador e que teve origem há cerca de 16 anos. Recordo que poucas vezes uma única cena, em todos esses anos assistindo filmes e séries, conseguiu instaurar em mim um terror tão absoluto como esta. E, como uma legítima e honrosa irmã da saudosa “Arquivo X”, só faz deixar ainda mais confusos os expectadores a cada novo capítulo exibido. Mais do que imperdível.