Jovem professora universitária de história viaja de navio com a filha, saindo de Portugal, com o objetivo de alcançar a Índia, onde seu marido, piloto de aviação, a aguarda para que juntos aproveitem suas férias. No caminho ela apresenta para a filha diversas cidades e algumas de suas estórias, ao mesmo tempo que em cada parada que o navio faz ganhamos um novo personagem daquele país em questão.
O diretor português Manoel de Oliveira concebe uma obra de elementos interessantes em “Um Filme Falado”: ao mesmo tempo que eles fazem a qualidade do filme também integram igualmente os seus defeitos – ou seja, os pontos positivos dos aspectos do longa também são os negativos, sob um outro ponto de vista. Usando como mote a viagem da professora universitária de história e sua filha cuiriosa, o diretor faz paradas em diversas cidades de diferentes países, ao longo do trajeto do navio, revelando fatos históricos curiosos, mitos e lendas de alguns de seus pontos turísticos. É delicioso acompanhar esta viagem, admirando belíssimos cenários do Mediterrâneo e Oriente Médio, constatando algumas de suas curiosidades, mas numa certa altura do longa-metragem isso fica demasiadamente cansativo, pelo seu caráter excessivamente didático que, por sinal, ocupa mais da metade do longa-metragem. Os dialógos entre os demais figuras do filme, de diferentes nacionalidades, é curiosamente engendrado por cada personagem em sua língua materna – fato reconhecido pelos próprios -, o que lhe concede uma atmosfera cosmopolita e erudita. Porém, o conteúdo das conversas, apesar de relevante, acaba logo caindo num certo pedantismo, uma intelectualização e filosofar que pesam demais e tornam as cenas arrastadíssimas, desnecessariamente lentas. A sequência final, baseada em uma ótima idéia, é realista, visto que surge de maneira inesperada, sem qualquer pista sobre a possibilidade disto poder ocorrer. No entanto, também fica algo díspare e perdida no filme, sendo finalizada de forma muito apressada, quase desinteressada – Manoel de Oliveira poderia ter planejado este prólogo de forma mais cuidadosa, planejada e dedicada, sem prejuízo de perder o caráter realista do fato e sem colocar em risco a atmosfera autoral e artística do seu longa-metragem.
Ao cabo da expectação, conferimos que Manoel de Oliveira produziu um fillme relevante, mas que acabou prejudicado pelos excessos do cineasta, que tornou assim seu filme bastante cansativo, mesmo para espectadores treinados, tolerantes e pacientes. É um filme a ser visto, como a maior parte dos longas que vem da Europa, mas que não apresenta muitas razões que justifiquem de ser lembrado entre os seus filmes preferidos.
Tag: europa
É mais do que verdade afirmar que tenho enorme ignorância no que se refere ao trabalho da banda irlandesa U2. Deles tenho conhecimento de poucas músicas de toda a carreira, algumas de suas origens, outras mais recentes. Mas esse ignorância confessa tem uma razão de ser: o único disco da banda que conheço integralmente é Zooropa, de 1993. Infelizmente, tentei começar a conhecer U2 no trabalho mais desafiador de sua carreira, e isso acabou gerando uma enorme frustração e desinteresse com os outros álbuns. Ouso declarar, dentro de minha ignorância, que tive o azar de começar com o melhor disco da banda, um dos únicos que ouvi até hoje que apresenta sete faixas fabulosas, consecutivamente.
A primeira delas é a soturna faixa título do disco. “Zooropa”, conta com fantástica introdução soturna, à base de piano e guitarras em solos dramáticos e distantes, e entre ruídos difusos e retrabalhados, registros de vozes captadas, vocais manipulados, samplers e loops de guitarras e eletronismos diversos, Bono Vox canta versos que celebram, de maneira irônica, o progresso da Europa pelo uso e aplicação da tecnologia. “Babyface”, maravilhosa canção de amor confesso à uma ninfeta, apresenta Bono cantando em vocal duplo, com sua voz natural e outra em meio-falsetto, com um delicado tilintar eletrônico e diversas guitarras de sonoridade distorcida e rústica ao fundo, tudo devidamente acompanhado pelos loops e samplers algo espaciais que invandem todas as canções do álbum. “Numb”, com letra repleta de versos que censuram tudo que possa ser imaginado, traz uma exceção na discografia da banda, já que o vocal à frente da melodia, em tom recitado, é o do guitarrista The Edge, com versos cantados em falsetto por Bono ao fundo e outros vocais difusos. A música inicia com uma percussão minimalista e samplers de acordes cortantes de guitarra. A medida que avança a bateria vai sendo encorpada e a canção ganha exponencialmente mais ruídos indistintos, até virar um caos sonoro, guiado pelo vocal genialmente blasé de The Edge. Voltando à crítica tecnológica, em “Lemon” a banda fala sobre como o homem, ao alterar a sua vida com a o avanço tecnológico, esquece as coisas mais simples que almeja. O vocal em completo falsetto de Bono Vox guia a música, e é acompanhado pela sua própria voz multiplicada e coberto pela melodia cuja base é toda feita em samples sôfregos, loops hipnóticos e bateria compassada. “Stay (Faraway, So Close!)” foi tema de “Tão Longe, Tão Perto”, a sequência do idolatrado “Asas do Desejo” do diretor alemão Win Wenders. A música é uma das primeiras, depois de quatro faixas, a deixar a guitarra soar seus acordes com naturalidade. Apesar da estrutura clássica, uma espetacular melodia triste e pesairosa cantanda por Bono sem medo de deixar brotar a sua emotividade, a base de samplers retorcidos prossegue ao fundo, com mais descrição. A letra retrata um cotidiano de eventos imutáveis, tão automatizados que nos torna insensíveis e já não nos afeta mais. “Daddy’s Gonna Pay for Your Crashed Car” apresenta introdução opressiva, lembrando um pomposo hino militar, que logo é suplantado pela mistura agitada de reverberante bateria acústica e programação eletrônica de loops agitados e nervosos. Bono solta seu vocal com ironia e muita vontade em boa parte da música, o que coincide com as letras que falam sarcasticamente sobre a tentativa de independência de alguém que não consegue se livrar dos cuidados paternos. “Some Days Are Better Than Others” é feita de versos perfeitos que encantam o ouvinte na primeira audição ao listar inúmeras situações e sensações positivas e negativas em nosso aparentemente interminável cotidiano. Da mesma forma que as letras, a melodia captura logo quem a escuta, com seu baixo gingado e deliciosos loops de riffs de guitarra que surgem no refrão da música, seguida por programação eletrônica fantástica.
Não sei se foi sorte ou azar, apenas sei que Zooropa satisfaz com folga a minha vontade de ouvir U2. Da forma como se encontra hoje, considerada fenomenal, altamente politizada e inteligente até por uma pedagoga ignorante que mal sabe o que é música, duvido que a banda consiga produzir algo tão excitante musicalmente quanto esse maravilhoso universo de canções irônicas e tristes, iluminadas por um eletro-rock espetacular – em grande parte graças ao toque pós-moderno da produção de Brian Eno. Eu não reclamo – tenho meu Zooropa aqui a meu dispor, satisfatoriamente alimentando com louvores a minha paradoxal nostalgia futurista.
Baixe o disco utilzando o link e senha abaixo para abrir o arquivo.
senha: seteventos.org
http://d.turboupload.com/d/1282406/youtoo_zoo.zip.html
Deixe um comentárioNa Espanha da Guerra Civil, uma garota fascinada por contos de fada acompanha a mãe grávida para o campo, onde viverá na companhia do padrasto, um capitão do regime fascista de Franco. Lá, em meio a insurgência dos rebeldes contra o regime ditatorial, a truculência de seu padrasto e a gravidez de risco de sua mãe, a menina Ofélia descobre um labirinto cujo habitante é um fauno, que afirma ela ser muito mais do que já imaginou na sua vida.
Guillermo del Toro é mexicano, mas tem visível predileção por criar estórias ambientadas na terra que colonizou seu país natal. Foi assim que ele ganhou fama com “A Espinha do Diabo”, um filme que misturava atmosfera de horror com um fundo político, e cujo argumento fazia de crianças as protagonistas do longa-metragem. Em “O Labirinto do Fauno”, del Toro volta a seguir igualmente a fórmula que lhe consagrou: este filme é em parte uma fábula, em outra um filme de horror-suspense, e em outra ainda um drama político. Todas estas facetas de gênero estão embricadas no argumento, fazendo desta, portanto, uma fábula que não almeja o público infantil. Decorre-se daí alguns defeitos e igualmente as qualidades do filme. No caráter negativo eu diria que o fato de ser em parte uma fábula atrapalha consideravelmente e gera os dois maiores problemas do longa-metragem. Por ser basicamente uma fábula é que a construção dos personagens não vai muito longe, muitas vezes resumindo-se aos estereótipos mais planos: o vilão é cruel, sanguinário e insensível como ninguém, e os “mocinhos” da trama são bons ao ponto de fazerem mal apenas quando necessário, sempre de forma justificada. A faceta política do filme, por consequência disto, fica um tanto óbvia, resumindo-se a pintar o regime do ditador Franco como o inferno que todos já sabemos de pronto ser, e a revolução popular como a tão idealizada solução para esta situação. Longe de mim fazer qualquer elogio a ditadura, mas a guerra é bem mais complexa que isto – mesmo a civil, como nossos tempos bem nos mostram. Por outro lado, justamente por ser um filme tão hibrído, é que isso possa ser justificado, sob outro ponto de vista: pode-se dizer também que os horrores e a maldade constrastam tanto com a bondade devido ao filme ser centrado na mente ingênua de uma criança, ainda acostumada e enxergar a vida sob a ótica do preto e branco. Dentro de uma fábula, mesmo uma meia-fábula para adultos como esta, não há muito como fugir da construção mais plana do bem e do mal, já que elas se baseiam nesta dicotomia. Um segundo aspecto interessante é o fato do roteiro de del Toro trabalhar o tempo todo com a ambiguidade, sem revelar se o aspecto fabular da estória é verdadeiro ou apenas uma enorme ilusão da mente criativa de Ofélia – há pequenos detalhes durante o longa-metragem que deixam o público sem saber o que pensar, visto que eles tanto negam quanto afirmarm ser tudo verdadeiro. Além do mais, as ótimas atuações do elenco, cenografia e direção de arte primorosa, suspense muito bem sustentado, os belos enquadramentos da câmera na sequência inicial e final, a trilha sonora soberba e emocionante e a estória sensível fazem, no conjunto, toda a qualidade do filme.
Considerando-se as avaliações da crítica como exageros – há desde “o filme do ano” até afirmações de que esta é “a obra-prima de del Toro” – e levando em conta os aspectos intrínsecos da fábula tanto como defeitos ou qualidades deste longa-metragem multi-gênero, há de se concordar ainda assim que este é um filme acima da média, tanto por possuir as caractérísticas já conhecidas do cinema de del Toro – o uso de sequências de violência gráfica bastante explícita, mistura de gêneros competente e visual onírico – quanto por ter conseguido o que poucos cineastas conseguem: ter sido bancado, em parte, pelos Estados Unidos, para produzir um filme que fala sobre eventos não-americanos utilizando uma língua outra que não a inglesa. E isso só já é um ponto muito positivo – para o cinema como um todo.
Não sou exatamente um fã de Tanita Tikaram: a maior parte de suas composições são de um folk tão desigual e estrambólico que fica muito, mas muito difícil passar de uma faixa para a outra, tentando achar algo que agrade dentro de todo um disco. Com Lovers in the City, de 1995, a cantora e compositora alemã iniciou uma mudança em sua música que tornou suas canções bem menos bizarras. Assim, ao me deparar, lá em 1998, com o disco The Cappuccino Songs, eu já conhecia a sonoridade amoníaca de Tanita mas, olhando a simpatíssima capa deste seu novo – à época – álbum, me senti compelido a arriscar. E, ao fazê-lo senti-me estupefato, tamanha a surpresa ao constatar a mudança absurda na sonoridade de suas composições. Tanita Tikaram simplesmente pulou de um extremo para o outro, jogando do topo de um arranha-céu toda a esquisitisse folk que tinha criado e mergulhando num projeto de música pop até o último fio do seu cabelo. O disco é tão repleto de orquestrações de cordas, de acordes algo óbvios de piano, de backing vocals e letras românticas que chega, em alguns momentos, e soar um pouco cafona e piegas – mas nem por isso deixa de ser um belo disco de música pop. Qualquer pessoa que tenha ouvido alguma coisa composta por Tanita antes do álbum Lovers in the City já vai se assustar com a faixa de abertura, “Stop Listening”. A música já começa com uma introdução grandiosa e ligeira de sua onipresente orquestração de cordas, que cede logo o lugar à voz grave e macia de Tanita. Uma percussão suave acompanha a sua voz, até que as cordas tomem novamente a melodia, junto com um piano de acordes melosos mas perfeitos dentro da música, que então sucede momentos mais calmos e outros de absoluta quandriloquência melódica. O lirismo excessivo da melodia é reflexo da letra, que trata da turbulência de sentimentos e desejos paradoxais em uma relação afetiva. “Light up My World” utiliza a base orquestrada de forma mais comedida, dando mais destaque à tecitura acústica do violão, à percussão suave, à bateria complementar e ao vocal de tonalidades românticas. A letra fala sobre um amor do passado, um relacionamento que apesar de ter chegado ao fim ainda fascina e apaixona. “Amore Si”, que questiona em suas letras se o amor está sempre atrelado à dor e ao sofrimento, é uma das melhores faixas deste álbum: a melodia é perfeita, com um piano de acordes doces e melancólicos, uma percussão luminosíssima, orquestrações na medida exata e um violão que completa a música em momentos decisivos. O vocal de Tanita, que foi mixado em várias camadas da melodia, entoando diferentes versos ao mesmo tempo, fecha o trabalho iniciado pela instrumentação de maneira esplêndida – tente ouvir apenas uma vez, sem voltar a faixa outra vez (é verdadeiramente impossível). “Back in Your Arms”, assim como a primeira música do disco, utiliza um pouco excessivamente a orquestração na melodia, bem como um teclado mínimo – ainda bem – e um backing vocal tão batidos que deixa um gostinho um pouco ordinário à canção. No entanto, graças aos vocais delicados de Tanita e à sequência final do trabalho de orquestração, a música consegue cativar. Na letra Tanita suplica sentir, ao menos uma vez mais, todo o conforto de um amor perdido. A faixa subsequente, a música-título do disco, retrata em sua letra episódica um flerte despretensioso em uma cafeteria, que se converte na esperança de ser o amor de toda uma vida. A melodia é composta de um trabalho cuidadoso de programação eletrônica, que ganha no refrão a companhia do teclado de acordes sutis e da orquestração de cordas complementar. O vocal e vocais de fundo da própria Tanita, adocicados e suplicantes, são acompanhados por uma ou outra fala em italiano, o que confere uma atmosfera cotidiana e cosmopolita à canção. “I Don’t Wanna Lose At Love” destaca-se pela sua orquestração de cordas de intensa beleza folk, o que faz de certo modo a canção fugir um pouco da intensidade pop do disco, apresentando também uma programação eletrônica feita de loops usuais que misturam-se à melodia de forma bastante homogênea. Na letra da música, vemos o desejo de conquistar o objeto de uma paixão algo platônica. Em “I like this”, o vocal da cantora apresenta-se entre o sussurrado e o sentimental, e em cuja melodia temos como destaque, à semelhança de outras faixas, uma bela fusão de programação eletrônica mínima e orquestração de cordas sobressaltante, com participação importante de ótimos acordes ao violão. “I knew you” fecha o disco escancarando, sem vergonha e com vontade, uma descarada inspiração latino-americana – acordes de piano, violas, violinos, vocais e backing vocal estão todos mergulhados num tcha-tcha-tcha animadíssimo e requebrante. A letra simples fala da constante prática de disfarçar sentimentos a atitudes e uma relação afetiva.
Parece evidente que a idéia deste disco foi tentar amenizar os aspectos mais idiossincráticos da música de Tanita Tikaram, tentando torná-la popular da maneira que ela nunca foi – isso ficou evidente até mesmo na sua maneira de cantar, já que seus vocais soam nitidamente menos abrasivos, bem mais suaves e macios. O mais estranho nisso tudo é que mesmo a empreitada não tendo obtido sucesso, a cantora decidiu manter as modificações no seu estilo, como se pode observar em seu mais recente lançamento, Sentimental – um disco que funciona como uma versão mais polida deste aqui. Porém, mesmo com alguns excessos de floreamento pop, The Cappuccino Songs é um bom disco, delicioso de se ouvir sem muito pretensão e com algumas faixas preciosas. Não deixe de arriscar, como fiz eu, atirando totalmente no escuro ao comprar este CD, há oito anos atrás – mal não há, já que aqui você vai obter as músicas todas de graça.
Baixe o disco utlizando o link abaixo e a senha para abrir o arquivo.
senha: seteventos.org
http://d.turboupload.com/d/1249419/tanita_-_cappucino.zip.html
Deixe um comentárioJovem jornalista presencia, junto com toda a população atônita de Nova Iorque, uma misteriosa invasão de robôs gigantes. Ela decide, junto com bravo e famoso aviador (que por sinal é um ex-romance seu), investigar as razões e objetivos obscuros para tentar evitar que mais maquinarias invencíveis façam mais estragos no mundo.
É evidente que o trabalho da direção de arte neste filme é a sua maior qualidade – a mistura de elementos modernos com outros retrô deixa o longa-metragem repleto de belíssima e estranha nostalgia. No entanto, o elemento que a produção do filme achou complementar ao trabalho da direção da arte, consitui-se em um recurso extremamente irritante: a fotografia reluzente, aquela muito utilizada em produções de época, deixa a imagem com um aspecto tão chapado que torna a expectação incômoda durante todo o decorrer do longa-metragem – ao menos no meu caso, foi necessário um esforço enorme para tolerar esse “halo” na luz do filme. Além desse aspecto, há também o fato de que o filme foi inteiramente feito utilizando a técnica do Chroma Key – aquela em que a ação em primeiro plano é filmada sobre um fundo de cor única para que seja inserido digitalmente um segundo plano ao fundo. Isto não seria um problema muito grande não fosse a intenção confessa da equipe de produção de utilizar a técnica intencionalmente afastando o visual final de qualquer aspecto realista – o que acabou infelizmente se tornando um novo paradigma no método de filmagem, visto que filmes como “Sin City” e o ainda não lançado “300 de Esparta” o fazem inspirados neste. O resultado, da forma como foi utilizado o recurso, irrita tanto quanto a fotografia aureolada do longa-metragem. Claro que, mesmo com os aspectos técnicos trabalhando contra o filme, ainda poderíamos ter um longa-metragem interessante se os outros pontos a ser considerados pesassem à seu favor. No entanto, eles não se configuram como algo positivo. O argumento cheira à fábula requentada – chegando mesmo a citar “O Mágico de Oz” – com a desculpa de “filme-homenagem” e de reinvenção de um gênero. Os personagens são extremamente caricatos, e as situações armadas no roteiro, consequentemente, tão batidas quanto os seus agentes. Por sua vez, o elenco é díspare e desigual, já que os onipresentes Jude Law e Angelina Jolie já saturaram o público com a sua imagem dentrou (e) ou fora das telas e Gwyneth Paltrow, sozinha, não tem muito como salvar todo um filme.
Ao fim, este filme não tem qualquer coisa que lhe configure o status de produção marcante ou relevante, mesmo dentro do cinema do circuito comercial. A inspirada direção de arte não tem força para conferir, por si só, aspecto relevante para que o filme seja uma produção a ser lembrada. A bem da verdade, tem que se admitir que este filme tornou-se realmente muito influente, porém foram os seus aspectos técnicos negativos que chamaram a atenção de cineastas, para nosso azar. Resta apenas esperar que um bom número de futuras produções envoltas nesta “atmosfera técnica” tornem-se fracassos retumbantes – é só assim, quando pesa no bolso, que Hollywood para de nos infernizar com alguns de seus “achados” mais irritantes.
Casal de classe média-alta recebe, certa manhã, uma fita de vídeo constando filmagem de longa sequência da entrada de sua residência, acompanhada ainda de um desenho obscuro de traços infantis. Não demora muito e outras fitas e desenhos sucedem-se, sendo que uma destas revela relação com as origens do patriarca da família. O apresentador de TV e sua esposa, ambos envolvidos com o mundo literário, sentem-se mais e mais ameaçados e intrigados com a origem das fitas e com as intenções de quem as produziu.
Juliette Binoche e Daniel Auteuil são as escolhas corretas para este que é o filme mais recente do alemão Michael Haneke. Os dois são atores excepcionais, capazes de desempenhar papéis de todas as gamas possíveis. Aqui, eles interpretam um casal culto de classe média alta, mas que tem, ao mesmo tempo, uma natureza ordinária – não são muitos os atores que conseguiriam unir estas duas diferente nuances no mesmo personagem. Saindo do mérito interpretativo, Haneke merece todos os elogios pois, como no seu filme anterior, arquiteta uma estória complexa que se esconde sob a abordagem clássica do cinema europeu. O que a primeira vista parece um argumento que explora a insegurança da vida urbana, mostra-se, em uma camada mais profunda, uma discussão bastante cara ao cineasta: a situação dos imigrantes na França deste início de século. Georges Laurent, o personagem de Auteuil, age baseado em motivações justas, procurando proteger sua família a todo custo, mas na tentativa de encontrar o mentor das fitas misterioras, Laurent define para si um culpado e, como no passado, humilha e recrimina alguém que já sofre e encontra-se em uma situação infeliz, sem nunca ter prova definitiva de que suas suspeitas procedem e suas ações justificam-se. Alguns poderiam afirmar que o personagem age deste modo porque encontra-se tão confuso quanto o expectador, já que Haneke não apresenta no filme respostas claras à estas indagações, porém não são as respostas às dúvidas surgidas a razão de ser de “Caché”, mas sim esta analogia, muito bem posta, entre as atitudes da França e dos franceses com relação à estrangeiros, particularmente aqueles originários das ex-colônias do país. “Caché” é excepcional em sua abordagem sociológica, mas também figura como um longa de expectação consideravelmente incômoda, devido à sua temática realista e seus conflitos eminentes e constantes. A decisão de não adotar trilha sonora durante todo o filme amplia o desconforto do expectador, potencializa o realismo da trama e aproxima-o ainda mais dos acontecimentos da estória. Além dessa secura na abordagem do longa-metragem, a maneira como Haneke exibe as filmagens dos cassetes, tomando a tela com as imagens destes, põe o expectador na mesma situação dos personagens que tem sua privacidade e segurança repentinamente ameaçadas – uma idéia que, combinada com a natureza do roteiro e de seus argumentos, explora magistralmente a relação entre filme e expectador, tornando esta relação insuportavelmente tensa, mantida em um desagradável suspense contínuo.
Haneke é, a cada filme, um dos cineastas europeus com a proposta mais consistente, aliada à uma técnica apurada e um gosto pela polêmica – não à de natureza gratuita ou leviana, mas a polêmica necessária, aquela que questiona e induz à reflexão. Além de muita coisa mais, cinema também é isso, uma maneira de despertar o pensamento humano sobre a realidade e a consequência de suas ações. Apesar de, até este momento, Haneke ter se mostrado um cineasta coerente, tenho que revelar que até mesmo ele rendeu-se aos encantos de Hollywood: neste momento, o diretor está finalizando uma refilmagem, com elenco americano, de um dos seus primeiros e mais contundentes longas, chamado “Funny Games”. Vamos torcer para que esse projeto seja apenas uma curiosidade singular e pessoal do diretor, e que ele retorne logo para continuar a produzir no seu continente natal, visto que, no cinema americano, dificilmente alguém consegue produzir algo tão relevante e complexo quanto seus dois últimos filmes.
Mesmo não sendo fã da banda Radiohead, gostando apenas de algumas poucas faixas de seus álbuns, resolvi arriscar ouvir The Eraser, o álbum solo do vocalista da banda. Foi uma boa idéia – mesmo o disco não se revelando estar entre as minhas preferências, há ali um projeto sonoro bastante coeso e faixas bem acima da média.
O disco inicia com a idiossincrasia da faixa título do álbum que, como a maior parte das faixas do disco, é essencialmente eletrônica. O sampler de um piano repete-se continuamente ao fundo, enquanto ruídos intencionalmente sujos encorpam a base da canção e sobrepostos pelo vocal anasalado de Yorke, que ao mesmo tempo segue e foge da limitada melodia. Na parte final da canção a base eletrônica é re-sampleada e ganha um ruído abafado ainda maior, sumindo aos poucos e deixando o cantarolar baixo do cantor para encerrar a música. A letra trata dos jogos de aparência, as traições e segundas intenções que integram ambos os lados de uma relação afetiva. Logo depois temos “Analyse”, um dos pontos altos do disco, com letras que falam sobre a insistente busca humana de um sentido maior na vida que, geralmente, deixa os que travam esta busca mais confusos do que antes de terem a iniciado. A melodia é bem menos minimalista e seca do que a anterior: os acordes do piano ousam ser mais melódicos e emotivos, acompanhados por uma base eletrônica complementar constante que, apesar de bastante sincopada, complementa estranhamente bem a beleza do piano e vocais fabulosamente sensíveis de Thom Yorke. “The Clock”, a faixa seguinte, tem baixo bem mercado e um loop curto constante, feito à base de ruídos eletrônicos e samplers hiper-minimalistas de guitarra e de percussão. O vocal de Thom aparece em várias camadas diferentes pela melodia, que no âmbito geral produz uma sensação de desconforto urbano pós-moderno. A letra, como indica o título da canção fala do tempo, mas dentro do espaço da relação afetiva e das ilusões e desejos dentro delas construídas. “Skip Divided” é a canção em que Yorke menos utiliza os seus famosos falsettos, preferindo cantar com uma voz menos empostada e mais natural. Funciona muito bem dentro da melodia de tons noturnos, recheada de eletronismos obscuros e vocais de fundo distorcidos e redistorcidos que, de tão bruxuelantes, me lembram as melhores passagens da inspiradíssima trilha sonora de Wojciech Kilar para o filme “Drácula”, idealizado por Francis Ford Coppola. Na letra, Thom Yorke disseca a dor, agonia e descontrole doentios que a simples visão e proximidade de alguém por quem nos apaixonamos pode despertar. “And It Rained All Night” inicia com uma miríade de ruídos eletrônicos que se entrelaçam em uma espiral sonora, até serem estranhamente sobrepostos pela acústica de baquetas de bateria sendo batidas uma contra a outra. O loop das baquetas prossegue continuamente, enquanto surge na música mais um riff marcante do baixo e um teclado que lembra o som de um temerim, algo claramente inspirado em filmes de terror e suspense cheios de soturnas figuras alienígenas – loops e samplers sujos de ruídos indistintos ou de guitarras deformadas também perfazem a melodia delirante da canção. A letra contribui na preservação do clima perturbardo da melodia, falando sobre uma noite de sono perdida por um ruído incômodo de chuva, o que abre espaço na mente cansada para ser tomada por delírios de Nova Iorque ser completamente alagada por águas torrenciais – faixa de clima mórbido interessantíssimo. “Harrowdown Hill” é outra canção que se destaca no álbum, apresentando um baixo (ou guitarra?) de presença forte na música, funcionando quase como uma bateria, cujos acordes dedilhados se repetem ciclicamente durante toda a canção. Sonoridades sobressalentes são construídas pelos loops minimalistas que complementam a base da canção e também pelo constante orgão de leve variações melódicas, que potencializa a sensibilidade do vocal de Yorke e produz uma pausa na sequência final, acompanhada brevemente por acordes espaçados e adocicados de piano que deixam o ouvinte suspenso na melodia por alguns instantes. Yorke declarou que sua letra foi baseada na morte de David Kelly, o cientista que derrubou, usando provas e estudos, as motivações britânicas – e consequentemente americanas – para a invasão do Iraque. Mas, analisando a revelia deste dado, pode-se dizer que a letra trata do desejo humano de fuga e de revolta diante da confusão e desprezo sobre as individualidades e sentimentos.
The Eraser não compraz ainda uma sonoridade que grade em extremo, nem faz seu criador passar muito mais notado por aqueles que nunca o tiveram como preferência. No entanto, o disco revela que Thom Yorke é capaz de modificar a sua idiossincrática veia criativa para atingir uma outra parcela de público sem, no entanto, colocar em risco a identidade musical criada com tanto esmero e afinco à frente da banda Radiohead. É um grande mérito já que, algumaa vezes, projetos solo descambam para algo sem novidade alguma, servindo apenas ao propósito de apaziguar o ego de uma artista que se sentia tolhido ou pouco livre para expressar-se.
Baixe o disco utilizando a senha a seguir para abrir o arquivo.
senha: seteventos.org
http://d.turboupload.com/d/1223894/Yorke_-_Eraser.zip.html
Sim, eu já tinha postado este álbum por aqui. No entanto, tinha feito isso sem escrever uma resenha. Me dei ao direito de refazê-lo, agora que o escutei com cuidade e avalei. (Re)Aproveitem.
Deixe um comentárioDois amigos, jovens mágicos aprendizes, ambicionam tornarem-se os melhores já conhecidos no ramo. A medida que o tempo passa a competição entre ambos começa a avançar tanto que nada, nem ninguém, lhes importa tanto quanto superar o sucesso de seu rival.
Christopher Nolan já mostrou até onde vai sua criatividade e ambição ao criar “Amnésia” e reiniciar a saga do homem-morcego nos cinemas com “Batman Begins”. Ao anunciar o projeto de “The Prestige”, contratando como protagonistas dois dos maiores astros do cinema comercial no momento, Hugh Jackman e Christian Bale, bem como a jovem atriz que ganha mais prestígio a cada longa, Scarlett Johansson, qualquer pessoa sensata já enxergaria aí a montagem de um imenso marketing para o longa-metragem, sem nem mesmo a produção ter se desenhado definitivamente. Durante o desenrolar da produção em si, notícias sobre o argumento do longa, e alguns de seus acontecimentos, chegaram ao conhecimento do público, e os fãs de Nolan começaram a babar pela enorme espectativa diante do filme. Contudo, apesar de ser uma produção de ponta, com boa atuação do elenco – particularmente Hugh Jackman -, direção competente, fotografia baseada em luzes e sombras bastante misteriosa e argumento bem concatenado, “O Grande Truque” é um filme que, a certa altura, começa a irritar o espectador – e a irritação só aumenta de nível até a conclusão do longa. A razão mais notadamente óbvia para tanto reside na construção da personalidade dos protagonistas: os mágicos intepretados por Jackman e Bale tem como única preocupação na vida atingir a superação profissional, esquecendo e ignorando, com vemência, os sentimentos do todos aqueles que os cercam, conhecidos ou não, em detrimento de sua competição pessoal – não há modos de nutrir simpatia pelo mago de Bale, já que sabe-se que tudo na vida dele foi subjugado e supremamente sacrificado em detrimento de sua carreira como mágico e de sua obssessiva competição com o rival Robert Angier que, ao menos, tinha inicialmente uma motivação pessoal compreensível para fazer o mesmo. Além disso, a medida que o filme aproxima-se de sua conclusão, os acontecimentos e reviravoltas do argumento, bem como a direção do longa-metragem, perdem-se gradualmente na sede de surpreender e estarrecer a platéia – definitivamente, é pretensão demais para uma carreira ainda muito curta.
No saldo final, “O Grande Truque” é um longa-metragem cuja pretensão do argumento, escrito à quatro mãos por Christopher e seu irmão, acaba atrapalhando mais do que sendo o responsável pelo seu engrandecimento. Para que este fosse um filme acima da média, os irmãos Nolan deveriam ter tornado os protagonistas mais humanos. Contudo, se eles não o fizeram com o intuito de querer mostrar até onde pode chegar a ambição, o epílogo do filme trai esta proposta, já que pretendeu-se revelar no personagem de Christian Bale uma emotividade até então não imaginada – e que não convence o espectador por um minuto sequer, devido à frieza deste diante das desgraças que causou ou desencadeou. O longa-metragem de Nolan é um bom filme, mas ele precisa, a partir de agora, parar de acreditar nos comentários da crítica, que o celebra como um dos maiores criadores do cinema comercial atual, e controlar a sua visível megalomania criativa. Do contrário, seus filmes vão passar a irritar o expectador desde a cena inicial, e não apenas a partir de sua metade final, como acontece com este aqui.

Com o devassamento emocional de “Dançando no Escuro”/Selmasongs, Björk enveredou ainda mais dentro da introversão artística e lançou uma de suas maiores obras-primas, o álbum Vespertine. Absurdamente celestial, o disco traz Björk entre murmúrios e gritos nos vocais, acompanhada sempre de instrumentos que enlevam a melodia e as letras em um interminável lirismo. “Hidden Place”, que foi lançado como o primeiro single, é uma das músicas símbolo do projeto: com letras que falam sobre uma paixão tão intensa que inspira uma união algo corpórea, a melodia traz delicados loops e ruídos eletrônicos e um belíssimo coro em um cantar enlevante, ambos guiados pelo cantar de Björk, por vezes suave e em outros desbravador – uma canção soberba. Com versos onde uma mulher revela as intimidades de seu deliciamento amoroso e sexual com seu amante, a artista islandesa infurna-se em enorme introversão e minimalismo em “Cocoon”, já que a melodia é feita apenas dos vocais sussurante da cantora e da delicadíssima programação de ruídos eletrônicos. Logo temos “It’s Not Up To You”, cujas letras revelam o inevitabilidade dos acontecimentos, mostrando que mesmo o que é bom pode acontecer à revelia de nossa vontade e esforço. A melodia mistura o minimalismo da programação eletrônicas feita de loops de ruídos com a grandiosidade celestial da orquestração de cordas, das harpas e coro islândes, todos em perfeita simetria. “Undo”, com letras que tematizam o suave esmaecer de nossas lutas e resistências íntimas, é mais uma faixa que abusa com maestria da mistura de minimalismo e grandiosidade: vocal transbordando suavidade, programação um pouco mais solta, harpas fulgurantes desde a metade inicial e mais tranquila da melodia, e o coral da islândia em uma participação fabulosa na sequência final da canção – um inevitável derramar de lágrimas é bem compreensível ao ouvir esta música, tamanha a perfeição de sua beleza. Com uma melodia constante em uma esplendorosa caixa de música, devidamente acompanhada pelo vocal quase carnal de Björk, por vezes multiplicado, acordes de harpa dedilhados pela fabulosa Zeena Parkins e programação eletrônica complementar, “Pagan Poetry” é exatamente o que revela seu título, poesia em estado puro, onde a cantora compôs versos inundados em sentimento e paixão. Marcando o fim da metade inicial do álbum, temos a instrumental “Frosti”, onde Björk utilizou-se apenas da caixa de música para compor melodia emocionalmente frenética. “Aurora”, com letras que derramam-se sobre o sentimento de perplexidade diante da beleza da aurora e da neve, traz a primeira participação da dupla Matmos, compondo uma base de ruídos eletrônicos mais encorpada e loops de sons captados de coisas bem pouco ortodoxas, como o som do pisar na neve, por exemplo. A composição de acordes da harpa e da caixa da música completam a sonoridade, que é fechada com o vocal mais solto e volumoso de Björk. “An Echo, A Stain” combina a base eletrônica bem composta de Matmos, a usurpante orquestração de cordas, a harpa episódica de Zeena Parkins e o coral de mulheres esquimós em uma melodia algo soturna, que sustenta uma sensação de soturno suspense cinematográfico durante toda a sua duração. A razão para tanto talvez seja o fato de que a letra da música traz versos que revelam sensações baseadas na leitura da peça “Crave”, da complexa escritora britânica Sarah Kane. “Sun in My Mouth” inicia com versos do poeta E.E.Cummings, e prossegue em letras de intensidade poética que não deixam muito à dever ao escritor inglês. A música foi composta utilizando acordes de harpa, celeste e programação eletrônica sutil, com enorme complementação melódica da orquestração de cordas. “Heirloom” tematiza sobre imagens idílicas de sonhos orínicos sobre maternidade e tem a melodia cuja programação eletrônica é a mais encorpada de todo o disco, toda baseada na canção “Crabcraft”, originalmente composta por Martin Console. “Harm of Will”, com letra composta em parceria com o roteirista e cineasta indie Harmony Korine, é uma ode ao músico Will Oldham. A melodia é uma das mais tristes do álbum, sentimento este despertado principalmente pelo vocal sensível de Björk e a orquestração de cordas e o coro enormemente melancólicos. “Unison”, com versos que celebram de maneira emocionanete a união e contentamento obtidos através da compreensão e entrega mútuos, fecha o disco com lirismo exobirtante: a programação eletrônica, composta em parte pela dupla Matmos, preenche os poucos espaços deixados pelo vocal luminosíssimo de Björk, pela melodia espetaculosa da harpa e pela participação mais grandiosa do coro de vozes no disco – a sequência final, que reúne de maneira fabulosa todos os elementos, é intensamente lacrimejante. A música é tão indescritivelmente bela que, se fosse intepretada com toda a pompa na Basílica de São Pedro, no Vaticano, arrebataria as almas de todos os presente diretamente para o paraíso.
Brotando do traçado delineado na trilha sonora que Björk criou para o filme de Lars Von Trier, Vespertine é um composto sonoro pulsante de sensações, algo difícil de explicar epalavras. É, talvez, o último disco perfeito da cantora islandesa, visto que a idiosincrasia sonora, utilizada com tanta cautela aqui, foi aglutinada e multiplicada em Medúlla e absurdamente extremada na trilha sonora de “Drawing Restraint 9”, resultando em dois discos difícies e excessivamente experimentais. Com a dilvugação da notícia de que nada menos que 7 faixas do próximo disco da artista contarão com produção da praga norte-americana que atende pelo pseudônimo de Timbaland – responsável por ter transformando todas as listas possíveis de “mais pedidas” em um intragável desfilar de rappers e R&B girls protagonizando vídeos ou fazendo participações -, a probabilidade de que a cantora possa ter pulado do extremo do experimentalismo para o extremo do populismo musical não deve ser descartada. Porém, em se tratando de Björk, podemos nos surpreender com um disco que desperte paixão tão imediata quanto foi com Vespertine. É esperar para ouvir.
senha: seteventos
mediafire.com/?s9qsvilt4vfofra
Deixe um comentárioA agente especial do FBI Clarice Starling, fragilizada por uma missão mal-sucedida e com sérios problemas no Bureau devido ao incidente, recebe uma oferta de um representante do alto escalão do governo, numa tentativa de ajudar a resolver um sério problema, ao mesmo tempo que poderia ganhar respeito e reconhecimento pelo seu trabalho novamente: a agente voltaria ao caso que a tornou famosa dez anos antes para resolver um pequeno detalhe deixado para trás: o Dr. Hannibal Lecter. E este encontra-se em Roma, Itália, onde tenta obter o emprego de “marchant” em uma importante biblioteca do país. Mas como Lecter voltou a figurar na lista dos dez mais procurados do FBI, é uma questão de tempo para que alguém descubra sua verdadeira identidade.
Eu poderia dizer que este é um filme desnecessário mas “assistível”, isso se ele terminasse logo quando o Dr. Hannibal Lecter foge da Itália. Porém, o diretor Ridley Scott não se conteve e foi muito, mas muito além. A partir da saída do canibal culto da Itália, o que se vê no filme é uma sucessão de sequências inconcebivelmente exageradas, que tem o objetivo claro de chocar. Um exemplo apenas, dentre vários possíveis: a cena final, o “jantar” arquitetado por Lecter para Clarice, não é apenas absurda em sua total inverossimilhança, mas também absolutamente desnecessária para a construção dos personagens. O que me faz pensar que tais sequências chocam muito mais pelo desgosto de destruir dois personagens, construídos com tanto cuidado e esmero no filme anterior, do que pelo horror das cenas em si. Isso, por si só, seria imperdoável. No entanto, este não é o único dos defeitos do filme. Saindo do roteiro, temos o problema dos atores e dos rumos de seus respectivos papéis. Apesar de Juliane Moore fazer o papel de Clarice de forma bastante eficiente, não há como não sentir falta de Jodie Foster: Clarice Starling ficou na memória com o jeito frágil e ao mesmo tempo seguro injetado por Foster, e o público nunca acaba sendo totalmente convencido de que Clarice agora é Juliane Moore, que transformou a personagem numa mulher amarga e fechada. O próprio Anthony Hopkins comete um erro ao carregar nas tintas de Hannibal Lecter nesta sequência, saturando no nível da altivez e petulância do personagem. O livro de Thomas Harris, e por consequência o roteiro de David Mamet, também tem seus méritos na destruição dos dois personagens, pela idéia do argumento em si. Basta comparar o argumento do filme de Johnatan Demme com o de sua sequência para enxergar o problema deste último: o filme anterior não era exatamente sobre Hannibal, mas sobre uma jovem agente que buscava pistas sobre um perigoso criminoso através do perfil desenhado por outro criminoso, igualmente perigoso. Assim sendo, Hannibal, apesar de ter destaque na trama, dividia espaço com dois personagens igualmente interessantes – o assassino que sonhava em se vestir, literalmente, com uma pele de mulher, e a agente do FBI, inexperiente mas absolutamente competente. O roteiro de “Hannibal” não foi tão engenhoso, resumindo-se a uma estória de crimes hediondos e suspense contínuo, apoiado pela incursão do sangue na tela orquestrada pelo exacerbação do responsável por estes atos. À primeira vista o roteiro parece engenhoso, devido ao nível de requinte das barbaridades perpetradas por Hannibal, mas isso é pura enganbelação, uma vez que o filme se resume somente à isto. E não adianta argumentar declarando que neste longa-metragem há um maior aprofundamento na personalidade dos protagonistas: o escritor, o roteirista e o interprete do personagem-título fizeram apenas potencializar – desnecessariamente – os traços da personalidade do Dr. canibal, pegando apenas o exemplo mais evidente. E isso fica muito nítido ao observar que, durante várias passagens do filme, tenta-se fazer crêr em um enorme – e acreditem, realmente enorme – poder de sedução, controle e domínio do senhor Lector sobre qualquer outro mortal, obtendo sucesso ao ordenar qualquer um de mutilar a si próprio, por exemplo. E, convenhamos, isso não dá para engolir da maneira que é posto no filme. O que me leva à minha observação final sobre a natureza do longa-metragem “Hannibal”: a sequência de o “Silêncio dos Inocentes” não passa de mais um filme que se resume à glamourizar um assassino e os seus crimes, jogando para escanteio toda a profundidade, pluralidade argumetativa e riqueza na concepção dos personagens que tornou o primeiro filme tão adorado e celebrado. É, no mínimo, uma tentativa lastimável de levar à frente uma “franquia” cinematográfica. Não foi por mero acaso que Johnatan Demme e Jodie Foster não quiseram fazer parte da empreitada. Isso seria imperdoável. Só sobrou Anthony Hopkins, que insistiu – ou foi convencido por um polpudo cachê – em devorar, no mau sentido, o personagem lapidado com tanto cuidado no primeiro filme.